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Desumanização em um faroeste virtual

No começo da semana, uma notícia chocou o Distrito Federal. Uma criança de 8 anos morreu em decorrência de um desafio de redes sociais. Sarah Raissa Pereira de Castro tentou realizar uma "trend" do "desafio do desodorante", que recentemente ganhou popularidade nas plataformas digitais. O desafio consiste em uma competição para ver quem consegue inalar uma quantidade de desodorante aerosol por mais tempo. Receita para o desastre, especialmente para crianças pequenas em uma realidade em que se está cada vez mais difícil vigiar plenamente o que os menores consomem no ambiente virtual.

Sarah Raissa foi encontrada pelo avó desacordada em sua casa, ainda segurando a lata do desodorante. Ela foi encaminhada às pressas para o Hospital Regional de Ceilândia, onde ficou internada por três dias, mas não sobreviveu à parada cardiorrespiratória. E o pior de tudo, ela não foi a primeira vítima. Em 9 de março, Brenda Sophia Melo de Santana (11 anos), morreu em um Hospital em Bom Jardim (Pernambuco), também após sofrer uma parada cardiorrespiratória devido ao Desafio do Desodorante. Isso porque elas foram os casos registrados, sem contar os diversos casos de crianças e jovens hospitalizados em decorrência de desafios da internet.

Na mesma semana, a Polícia Federal (PF) desencadeou a Operação Adolescência Segura, que desarticulou uma organização que praticava crimes cibernéticos contra crianças e adolescentes. E a investigação começou após outro desafio perigoso e preocupante. Em fevereiro deste ano, foi divulgado ao vivo um vídeo de um adolescente que jogou um coquetel molotov em uma pessoa em situação de rua. A maior covardia é que a vítima estava dormindo e, sem a chance de poder se defender, teve 70% do corpo queimado. É uma desumanização daqueles que sãos julgados inferiores aos demais - o que sequer deveria ser sequer cogitado por infringir nitidamente o Artigo 5º da Constituição Federal.

A internet é um mundo de extremos. Por um lado, humaniza pessoas e animais, com publicações recheadas de montagens com músicas emotivas e discursos apelativos, numa linha do sentimento intenso de valorização. Por outro lado, há uma forte desumanização de pessoas que, por estarem do outro lado de uma tela, não são vistas como seres humanos, apenas como fruto do ódio. E o ódio mata. Seja o descaso de achar graças de pessoas passando mal por inalarem desodorante ou na desumanização de pessoas que não têm casa, A internet não pode ser terra sem lei. O faroeste virtual precisa ser repensado e revisto.