Briga sobre Marco Temporal envolve agora a Presidência

Apesar de STF já ter considerado inconstitucional, texto aprovado no Congresso segue para sanção de Lula

Por Ana Paula Marques

Lula ouviu os pedidos da base governista

Apesar de já ter deixado claro ser contrário ao Marco Temporal das terras indígenas, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) vem sendo aconselhado a não vetar o projeto que estabelece a data de promulgação da Constituição, 5 de outubro de 1988,como data base de demarcação das terras indígenas. Tem ganhado força, na base do governo, o entendimento de que ele deve derrubar apenas alguns trechos do texto. O tema divide agora o governo entre um núcleo ambientalista e um núcleo político, que quer evitar novos conflitos com o Congresso.

A ministra dos Povos Indígenas, Sônia Guajajara, disse que irá entregar um parecer jurídico ao presidente para que ele vete por completo o projeto aprovado no Congresso Nacional há duas semanas. Outros nomes com os quais o presidente deve ter desgaste se aprovar o projeto são a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, o ministro dos Direitos Humanos, Sílvio Almeida.

Já o núcleo político tem aconselhado Lula a fazer apenas vetos parciais, mantendo a ideia original do Marco Temporal. No caso, tais conselhos vêm do ministro da Casa Civil, Rui Costa, e do líder do governo no Senado, Jaques Wagner (PT-BA). Os dois argumentam que o STF já considerou o tema inconstitucional. E que, assim. Lula teria um desgaste desnecessário com o Congresso caso vetasse o texto. Contra essa ideia, os ambientalistas argumentam que um veto parcial sinalizaria que o governo concordaria com a ideia da data da promulgação da Constituição como marco temporal.

Lula tem até dia 20 deste mês para decidir, e vem sendo aconselhado a vetar somente os “jabutis” itens incluídos no texto, que não têm ou que possuem pouca relação com o projeto que tramita. Mesmo que seja vetado por completo, o PL volta para o Congresso Nacional, onde a Câmara dos Deputados e o Senado Federal farão uma sessão para analisar o veto. Se formada maioria, o veto do presidente pode ser derrubado.

Como vem noticiando o Correio da Manhã, Legislativo e Judiciário vivem um conflito há algumas semanas, que, com a decisão de Lula, estende-se agora também para o Executivo. Ainda em setembro deste ano, o Supremo Tribunal Federal (STF) derrubou a tese que validaria o marco temporal e isso a tornou inconstitucional. Porém, o projeto de lei com o mesmo objetivo ainda continuou em tramitação nas casas do legislativo.

Se Lula sancionar o projeto ou se o Congresso derrubar seu veto, parece inevitável que o STF será chamado outra vez para julgar a questão. E provavelmente irá reforçar o que já decidiu quanto à inconstitucionalidade do Marco Temporal.

Desgaste

É por conta disso que os conselheiros políticos têm aconselhado Lula a não vetar integralmente o projeto. O presidente vem despendendo, desde o início do seu mandato, esforços e recursos para fazer com que a relação com os parlamentares seja a melhor possível. A razão por trás disso, explica o analista político da BMJ Consultores Associados, Bernardo Nigri, é que uma de suas prioridades são suas propostas econômicas.

“Um exemplo foi a minirreforma ministerial, onde vimos ingresso de políticos que não são necessariamente muito bem vistos pela base eleitoral do governo entrando em ministérios que antes eram ocupados por figuras queridas. Um acordo muito claro para o governo ter garantia de uma base de suporte no Congresso para aprovação de futuras propostas”.

Ele explica também que, para o governo, tendo em vista essa intenção de manter uma boa relação com o Congresso, é melhor que o ônus de derrubar essa lei fique com o STF. “O presidente tem pensado no futuro, como, por exemplo, a reforma tributária, que é uma medida de bastante interesse. Seria muito vantajoso para ele aprovar ainda este ano, já que tem um timing político bastante sensível, caso não seja aprovado agora” disse.

Apesar disso, a pauta ambiental é bastante sensível para o presidente deixar passar sem vetar pelo menos alguns trechos, explica o analista.

“O governo tem interesse em negociar para manter um equilíbrio entre a sua base eleitoral e a sua base de suporte no Parlamento, uma equação difícil”, avalia o analista. “Um veto mais duro, mesmo que seja ele integral ou na maioria dos trechos da lei aprovada, tem um custo político para os parlamentares se colocarem muito contra o governo”.