Por: Ana Paula Marques

Haddad, o complicado coletor de impostos

Será difícil Haddad conseguir manter o déficit zero | Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil

Há uma semana que o governo tenta uma saída para a Medida Provisória (MP) que reonera a folha de pagamento para os 17 setores da economia. Com a estratégia de aumentar a arrecadação e assim manter a promessa de zerar o déficit de 2024, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, está criando diversas arestas políticas para o Executivo.

Além da MP, que é criticada tanto por parlamentares, quanto dentro do próprio PT, o ministro agora se enrola em mais uma tensão com os congressistas, desta vez com a bancada evangélica — composta em sua maioria por parlamentares da oposição — depois da repercussão negativa no segmento religioso sobre a decisão da Receita Federal de anular a norma que dava isenção fiscal a líderes religiosos.

Haddad reuniu-se com o presidente da Frente Parlamentar Evangélica do Senado, Carlos Viana (Podemos-MG), para tentar um acordo no último dia (18). Ficou decidido, então, que a bancada evangélica e representantes do ministério e da Receita Federal formarão um grupo de trabalho para discutir a possível retomada da isenção.

Semana cheia

A semana passada foi marcada por agenda pesada para o ministro. Ele encontrou-se com os presidentes do Senado Federal, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), da Câmara dos deputados, Arthur Lira (PP-AL), e com outros nomes importantes para a negociação, como o líder do governo no Senado, Jaques Wagner (PT-BA).

Além de levar os possíveis acordos costurados ao presidente Luiz Inacio Lula da Silva com reuniões pontuais, o bastidor é de que o chefe do Executivo não está feliz com as tensões criadas no Parlamento. O Correio apurou que Lula, na reunião, pediu a Haddad que não crie novas arestas. “Resolva. Já tenho problemas demais com o Congresso”, disse ao ministro.

Recuo

O ministro parece ter envolvido o governo em algumas sinucas de bico, que levam, até o momento, a três alternativas para acordos: um projeto de lei de reoneração gradual para os 17 setores, a edição de uma nova MP ou, então, ceder sobre a Proposta de Emenda à Constituição que determina a reforma administrativa (PEC 32/2020) — uma moeda de troca que precisa ser analisada pelos parlamentares, o que dá espaço para negociações.

A situação, segundo o analista político André César, não irá se sustentar por muito tempo. “Haddad se isolou e agora tá tentando testar os limites para ver até onde ele consegue esticar essa corda. Mas o governo deve retroceder na reoneração e também em outras matérias econômicas que vão chegar ao Congresso e que precisam de apoio dos parlamentares”, disse.

Promessa cai?

A promessa de zerar o deficit, não só não será cumprida, como pode acabar dificultando a política do governo em 2025, e principalmente em 2026, ano de eleição presidencial, segundo o analista político Melillo Dinis. Isso porque não há consenso sobre o deficit no governo.

“A maior oposição de Haddad está nas mãos de Rui Costa, que, além de ministro-chefe da Casa Civil, trouxe para o seu departamento o novo PAC — maior programa de investimento do país —, que necessita de muito investimento público. Até a correta decisão de dar fim à isenção fiscal sobre a renda de líderes religiosos, realizada para atender a uma recomendação do Tribunal de Contas da União (TCU), acaba por ser tratada como uma caça aos líderes religiosos, que abre mais tensão”, explica Melillo.

O próprio TCU endossou os alertas sobre a possibilidade de o orçamento de 2024 conter receita “superestimada”. Para a área técnica do Tribunal, há chances de o Executivo registrar um déficit de até R$ 55,3 bilhões neste ano, o que acarretaria descumprimento da meta fiscal.

Para o analista, é pouco provável que a disputa sobre a isenção dos líderes religiosos se resolva a curto prazo. A promessa de déficit também enrola Haddad até o final do ano. “Acredito que a situação do ministro é exatamente caminhar por esse abismo num pequeno e estreito fio, em que ele não irá conseguir estabelecer qualquer grau de êxito”, disse.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado.