Presos de 8/1 podem ser anistiados? Advogado explica

Após pedido de Bolsonaro, PL no Senado que concede anistia vira palco de debate Por Gabriela Gallo

Por Gabriela Gallo

Depredação do STF após os atos de 8 de janeiro de 2023

Após os atos antidemocráticos contra as sedes dos Três Poderes, em 8 de janeiro de 2023, 1.430 pessoas foram presas em flagrante. As informações são do Supremo Tribunal Federal (STF). Alguns foram liberados, outros 200 aguardam julgamento e as ações e investigações da Operação Lesa Pátria seguem prendendo outros envolvidos nos atos.

No dia 25 de fevereiro, o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) organizou um ato com apoiadores, na Avenida Paulista (SP), para se defender das investigações da Polícia Federal (PF) que o acusam de participar de uma tentativa de golpe de Estado. No evento, ele pediu para que os Três Poderes concedam anistia às pessoas presas pelos atos.

“É uma anistia para aqueles pobres coitados que estão presos em Brasília. Nós não queremos mais que seus filhos seja orfãos de pais vivos. Nós já anistiamos, no passado, quem fez barbaridade no Brasil. Agora, nós pedimos um projeto de anistia para que seja feita a justiça no Brasil. Essas penas fogem ao mínimo da razoabilidade”, pediu Bolsonaro.

Após o pedido do presidente, uma consulta pública no site do Senado sobre o projeto de lei que concede anistia aos condenados pelos atos de 8 de janeiro (PL 5064/2023) – de autoria do ex-presidente da República, senador Hamilton Mourão (Republicanos-RS) -- virou foco de apoiadores e críticos a Jair Bolsonaro. A consulta pública está dividida. Até o fechamento desta reportagem, a última atualização da pesquisa, às 15:28 de sexta-feira (3), contabilizava 512.826 votos contrários à anistia e 462.565 favoráveis.

Lula

Quase três dias depois, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) afastou a hipótese. Em entrevista ao programa “É Notícia”, da RedeTV!, Lula descartou a possibilidade do poder Executivo tomar a iniciativa. E declarou; “A partir do momento em que o ex-presidente pede anistia, ele tá dizendo: ‘Não, perdoe os golpistas’ e está confessando o crime”.

“Eles [presos pelo 8 de Janeiro] nem foram julgados ainda, eles estão presos como garantia da paz e da ordem deste país. Ainda não se descobriu quem mandou, financiou, porque houve uma tentativa de golpe”, afirmou Lula.

O que é anistia?

Segundo o Código Penal, anistia é um “perdão” concedido a indivíduos envolvidos em uma situação de objeto de procedimento penal na Justiça. Como se o fato fosse completamente apagado do mundo jurídico penal, esse indivíduo não pode ser mais punido e, se já houver condenação ao tempo da anistia, os efeitos são anulados. Crimes hediondos como tortura, tráfico ilícito de entorpecentes e drogas semelhantes e terrorismo, são proibidos de serem anistiados, de acordo com a Constituição.

“Então, em tese, os crimes do 8 de janeiro podem, sim, ser objeto de anistia. Não só porque não esbarram nas proibições constitucionais”, afirmou o advogado especialista em direito penal Oberdan Costa.

No entanto, ele destacou que é preciso analisar os custos políticos e jurídicos do uso dessa anistia. “O último uso famoso que o Brasil fez dele, a Lei n° 6.683/1979, que anistiou as violações de direitos humanos ocorridas no regime de 1964, nos rendeu uma condenação perante a Comissão Interamericana de Direitos Humanos”, disse o advogado.

Em 1979, quando a ditadura militar já sentia seus estertores, o regime militar valeu-se dos poderes que ainda tinha para negociar a anistia. Havia na época o interesse de retorno ao país de diversos políticos que estavam no exílio, como Leonel Brizola e Miguel Arraes. Assim, aceitou-se a anistia. Crimes cometidos pela oposição ao regime, como as guerrilhas, foram perdoados. Mas acabaram também perdoados os crimes patrocinados pelo Estado, como as torturas e desaparecimentos. Isso evitou que por aqui acontecesse algo semelhante ao que é retratado no filme “Argentina, 1985”, que narra o julgamento, entre outros do general e ex-presidente argentino Jorge Rafael Videla. O general foi condenado á prisão perpétua.

Oberdan Costa também pontuou que a anistia só pode ser concedida pelo Congresso Nacional, por meio de lei federal. Portanto, para que seja concedida anistia a um ou mais indivíduos, é preciso que a Câmara dos Deputados e o Senado Federal aprovem um projeto de lei e ele seja sancionado pelo presidente da República.

“Na maioria das vezes a anistia é direcionada a crime político, de forma a perdoar as pessoas nele envolvidas”, afirmou Oberdan Costa.