Chanceler defende fala de Lula sobre guerra de Israel
Em comissão, ministro afirma que foi "profunda indignação"
Por Ana Paula Marques
Em audiência na Comissão de Relações Exteriores (CRE) do Senado Federal, o ministro das Relações Exteriores, Mauro Vieira, afirmou que as falas do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) sobre a guerra entre Israel e o grupo palestino Hamas surgiram de "profunda indignação". Vieira declarou na última quinta-feira (14) que a frase que comparava as ações de Israel na Faixa de Gaza com o Holocausto foram uma reação direta aos milhares de mortos vítimas das ações israelenses.
Além de ressaltar a posição histórica do Brasil em relação ao conflito no Oriente Médio, o chancelar afirmou que a diplomacia brasileira é a favor do "diálogo e negociações que conduzam à solução de dois Estados".
Em fevereiro, o presidente Lula associou os ataques de Israel à Faixa de Gaza ao Holocausto nazista contra os judeus, comandado por Adolf Hitler na Segunda Guerra Mundial. O governo de Israel reagiu e declarou o presidente persona non grata no país. Por conta da polêmica, o ministro foi convidado a comissão para dar explicações.
Sinceridade
Vieira defendeu a posição de Lula. "A questão que se impõe é quantas vidas mais serão perdidas até que todos atuem para impedir o morticínio em curso. É nesse contexto de profunda indignação que se inserem as declarações do presidente Lula. São palavras que expressam a sinceridade de quem busca preservar e valorizar o valor supremo que é a vida humana", disse.
O Hamas atacou Israel, em outubro de 2023, deixando 1.400 pessoas mortas e sequestrando outras 240. O Ministério da Saúde da Palestina, declarou que os ataques de Israel deixou mais de 30 mil pessoas mortas e cerca de 72 mil feridas na Faixa de Gaza, até o momento. Ou seja, na visão de Vieira, uma reação que gerou dano extremamente superior.
O ministro também criticou o governo israelense ao acusar a reação do primeiro-ministro de Israel, Benjamin Netanyahu, de ser desproporcional. "Israel tem o direito de defender a sua população, mas isso tem que ser feito dentro das regras do direito internacional. A reação de Israel não tem como alvo apenas os responsáveis pelo ataque, mas todo o povo palestino. Trata-se de punição coletiva", afirmou.
Oposição
Desde que o presidente Lula deu as declarações sobre Israel, a oposição ao governo tem tentado usar a frase contra o Executivo. Deputados contrários ao governo petista chegaram a protocolar um pedido de impeachment contra Lula ainda em fevereiro. A lista conta com a assinatura de 139 congressistas. Porém, desde então, o processo não andou.
Segundo o professor de Relações Internacionais da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUCSP) Rodrigo Amaral, a fala do chanceler brasileiro tenta tornar a fala do presidente Lula menos relevante, tanto para seus opositores internos.
"Não houve manifestação contra a fala de Lula nem do principal aliado de Israel, os Estados Unidos da America. Então, o ministro tenta acalmar os ânimos ao relembrar a longa amizade do Brasil com Israel, além de ressaltar que o problema é o governo israelense, não o país. Ele enfatiza o culpado e relembra que as relações bilaterais do Brasil com Israel são de longa data e devem continuar com e depois de Netanyahu", explica.
Venezuela
A próxima eleição venezuelana, que será realizada em julho, também foi debatida na comissão. O ministro das Relações Exteriores disse que o governo não pode "fazer outra coisa, a não ser o diálogo".
"Temos diálogo intensamente, não é de agora. Fui ministro das Relações Exteriores também da ex-presidente Dilma Rousseff", explicou.
Vieira também avaliou que a data das eleições na Venezuela é resultado da atuação do governo brasileiro. "Isso acontece, entre outras coisas, pelo contato que mantivemos com o governo venezuelano, chamando atenção para um processo eleitoral".
Para Rodrigo Amaral, o chanceler brasileiro demonstra na fala a principal caraterística da diplomacia nacional, a do diálogo. "A fala dele significa que o Brasil só poderá se envolver regionalmente, ou seja, como um mediador nas relações que envolvam possíveis conflitos entre países da America Latina, como foi o caso de Essequibo, território da Guiana", defende.
No ano passado, o governo de Nicolás Maduro realizou um referendo para "reafirmar" os seus direitos sobre o território da Essequibo, que está em disputa com a Guiana desde o final do século XIX. A Venezuela alega que o território lhe foi tirado. Após mediação do Brasil, Venezuela e Guiana prometem manter a paz.