Por: Gabriela Gallo

CFM prepara recurso sobre aborto em casos de estupro

Assistolia fetal é um método de interrupção da gravidez | Foto: Freepik

A decisão do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes de derrubar uma resolução do Conselho Federal de Medicina (CFM), sobre um procedimento usado em casos de aborto legal, gerou polêmica. Na última sexta-feira (17), o magistrado suspendeu uma resolução do Conselho que proibia na rede pública médicos de realizarem o procedimento "assistolia fetal", usado em procedimentos de aborto legal em casos de estupro. Moraes acatou um pedido da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) nº 1141 encaminhada ao STF pelo Psol. O CFM disse que irá recorrer da decisão, classificando o procedimento clínico como “profundamente antiético e perigoso em termos profissionais”.

Na prática, a suspensão tem efeito imediato até que a Suprema Corte chegue a uma conclusão sobre a ação do Psol. O plenário do STF irá julgar o caso em plenário virtual de 31 de maio a 10 de junho.

Assistolia fetal é um procedimento médico recomendado pela Organização Mundial da Saúde (OMS) para interromper gestações de mulheres com mais de 22 semanas de gravidez. O procedimento é uma injeção de produtos que induz à parada do batimento do coração do feto antes que ele seja retirado do útero da mulher.

“Optar pela atitude irreversível de sentenciar ao término uma vida humana potencialmente viável fere princípios basilares da medicina e da vida em sociedade”, acusou o Conselho Federal de Medicina.

A Constituição Federal proíbe o aborto no Brasil, com exceção de gravidez causada pelo crime de estupro e se for constatado que o feto é anencefálico. O debate acerca da descriminalização, ou legalização, do aborto é um tema complexo, que bate com a pauta de costumes.

Entenda

Em 21 de março, o Conselho Federal de Medicina publicou a resolução nº 2.378 proibindo a “assistolia fetal”, necessária para a realização de abortos que não gerem um risco à vida da mulher. O CFM declarou que a eliminação das vidas humanas viáveis promovidas por uma permissividade indevida deste procedimento configura “claro desrespeito a gerações posteriores”, colocando em perigo a identidade profissional da medicina, já que pode abrir margem para consequências diversas que precisam de melhor análise ética, profissional, científica e social.

“Veja que os fundamentos utilizados pelo Conselho Federal de Medicina não são jurídicos, mas são muito mais subjetivos e com base em princípios. Tanto é que a resolução está em desacordo com o artigo 128 do Código Penal, em seu inciso segundo, que diz que o aborto praticado pelo médico não será punido se a gravidez resulta de estupro, e que o aborto é precedido de consentimento da gestante – ou quando incapaz, de seu representante legal”, disse a advogada especialista em direito médico e da saúde Giovanna Salomão ao Correio da Manhã.

Após a resolução do CFM, o Psol e entidades do setor de saúde entraram com ações no Supremo para derrubar a medida. Na ação, eles alegaram que a proibição da assistolia é “uma violência adicional contra crianças e mulheres estupradas”. Moraes julgou abuso de poder do Conselho Federal de Medicina, alegando que o Conselho ultrapassou sua competência regulamentar ao impor que, tanto o profissional de medicina quanto a gestante vítima de um estupro, devam ter uma restrição de direitos não prevista em lei.

Questionada pela reportagem, a advogada especialista em direito médico e da saúde destaca que, por mais que o Brasil seja um país laico, os fundamentos religiosos definem a formação e discussão acerca da Constituição.

“A vontade e autonomia da mulher não são levados em consideração, haja vista que se preocupa muito mais com o feto do que com a própria vida existente. Infelizmente a interpretação da bíblia pelo homem fez com que gerasse um patamar de superioridade masculina e inferioridade feminina. De forma que eu arrisco dizer que, caso o homem fosse responsável por gerar a vida de uma criança, o aborto já teria sido legalizado”, declarou Salomão.