Por: Ana Paula Marques

STF reconhece assédio judicial a jornalistas

STF reconhece ação coordenada contra imprensa | Foto: Antonio Augusto/SCO/STF

O Supremo Tribunal Federal (STF) reconheceu de forma unânime, nesta quarta-feira (22), a inconstitucionalidade do uso de ações judiciais para intimidar a imprensa. Na prática, o alto volume de processos judiciais contra jornalistas em diversas varas deve ser considerado “assédio judicial”.

Além disso, os ministros definiram que profissionais e veículos de imprensa só podem ser responsabilizados judicialmente caso não haja dúvida de que agiram de maneira intencional na publicação de uma notícia. O julgamento retomou duas ações diretas de inconstitucionalidade movidas pela Associação Brasileira de Imprensa (ABI) e a Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji). As ações questionam as inúmeras ações judiciais contra jornalistas para impedir a atuação dos órgãos de imprensa.

Assédio

Todos os ministros da Suprema Corte aceitaram o pedido das associações, que foi movido em 2023 e no mesmo ano teve o voto de aceitação da então relatora Rosa Weber, hoje aposentada, e só foi retomado nessa terça. Todos os magistrados seguiram o entendimento do presidente do STF, o ministro Luis Roberto Barroso.

“Constitui assédio judicial comprometedor da liberdade de expressão o ajuizamento de inúmeras ações a respeito dos mesmos fatos, em comarcas diversas, com o intuito ou o efeito de constranger jornalista, ou órgão de imprensa, dificultar sua defesa ou torná-la excessivamente onerosa”, sugeriu o ministro.

Na prática, a proposta sugere que quando o assédio ficar configurado, o jornalista pode pedir que todas as ações passem a ocorrer em um único lugar—na Justiça do local onde reside. Esta tese será uma orientação a ser aplicada em processos que tratam do tema em instâncias inferiores.

Os ministros também entenderam que, nos casos em que for identificado o assédio judicial a jornalistas, os juízes que julgam os casos podem extinguir de maneira sumária o processo. Na prática, significa que o andamento de processos nos casos em que alguma empresa ou pessoa aciona o jornalista ou o veículo com processos semelhantes em diferentes varas pode se tornar mais difícil.

A ministra Cármen Lúcia destacou que o trabalho da imprensa é protegido pela Constituição e que, na democracia, a Justiça não pode ser usada para tentar impedir o trabalho da imprensa livre.

Quando culpados

O ministro Barroso também propôs que jornalistas e veículos só podem ser responsabilizados em caso de dolo ou culpa grave. Em seguida, o ministro Alexandre de Moraes sugeriu que o termo “culpa grave” fosse trocado por “negligência”, entendimento acompanhado pelos ministros Dias Toffoli e Gilmar Mendes.

Em sua argumentação, Moraes relembrou o "caso da Escola Base", episódio de uma denúncia equivocada de suposto abuso sexual em um colégio em São Paulo divulgada pela imprensa e que depois se comprovou não ser verdadeira. Para o ministro, seria difícil estabelecer o que seria uma "culpa grave" dos jornalistas. Porém, como não conseguiu número de entendimento o suficiente, ao final da sessão, a resolução manteve a definição de Barroso.

Exemplos

Os ministros defendem que episódios como a apresentação de 22 ações por magistrados com pedido de indenização contra repórteres do jornal Gazeta do Povo, que publicaram reportagem sobre supersalários do Paraná, sejam instintos.

As ações foram apresentadas em pelo menos 15 cidades em 2016, o que obrigou os cinco jornalistas que assinaram o material a viajarem por dias seguidos para as audiências. Em 2023, a Suprema Corte extinguiu essas ações por entender que houve assédio.