Por: Ana Paula Marques

Lira pode adiar regulamentação da tributária

Jogar para segundo semestre pode ser trunfo para Lira | Foto: Lula Marques/ Agência Brasil

Sem relator e com dois grupos de trabalhos montados para a tramitação dos textos que irão regulamentar a reforma tributária, a primeira audiência pública na Câmara dos Deputados, na terça-feira (28) contou com a presença do secretário extraordinário da Reforma Tributária do Ministério da Fazenda, Bernard Appy. Tanto governo quanto parlamentares esperam que o texto final seja aprovado ainda neste semestre para ser encaminhado para o Senado Federal. Mas especialistas ouvidos pelo Correio da Manhã desconfiam que essa pode não ser exatamente a intenção do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL).

O Grupo de Trabalho (GT) da regulamentação dos três novos tributos criados pela reforma tributária: o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), a Contribuição Social sobre Bens e Serviços (CBS) e o Imposto Seletivo (IS), definiu que não haverá uma divisão por temas na análise do projeto de lei (PL 68/2024). Com isso, para fazer qualquer alteração no texto do governo, os deputados precisarão entrar em um acordo entre os seus sete integrantes.

É por essa razão que os especialistas duvidam que chegar rapidamente a um texto final seja mesmo a intenção de Lira.

Estratégia

Para o cientista politico Leandro Gabiatti, decidir concentrar a negociação em um grupo e não em um relator tende a dificultar o processo de decisão. “Quando mais pessoas, menos existe um poder concentrado em decidir o processo de negociação, de articulação e até mesmo de alteração de alguns trechos. Lira acabou por dividir o processo. Não se sabe quem vai construir o texto, quem irá determinar o viés do relatório final. Os sinais dados pelas ações de Lira são de que talvez ele não queira mesmo conferir agilidade aos textos nesse momento”, disse.

Como a regulamentação da reforma tributária é uma das pautas mais importantes do Congresso Nacional no momento, para o especialista, Lira pode imaginar que seja uma boa estratégia deixar o texto para o segundo semestre do ano. “No segundo semestre, Lira criaria então uma agenda importante para negociar sua sucessão. Então, ao segurar o texto, ele sairia como vitorioso no final do ano e até mesmo tiraria o presidente do Senado Federal, Rodrigo Pacheco (PSD-MG) como uma figura de destaque já que, se a Câmara só aprovar no final do ano, o texto só chegaria no Senado em 2025”, explica.

Esse é o último ano do mandato de Arthur Lira e Rodrigo Pacheco como presidentes das Casas Legislativas. Desde o início do ano, os dois articulam para deixar aliados na sucessão de suas cadeiras.

Previsão

Para o cientista politico Guilherme Carvalhido, qualquer proposta fica mais complicada sem uma relatória e isso irá dificultar o fechamento do processo. “O normal é que qualquer órgão colegiado em que haja uma votação em questão, tenha um relator como um indicativo da ação. Mesmo que haja discordância, é necessário haver isso. A não colocação do relator demonstra exatamente que não há consenso algum na reforma tributária dentro da casa”, disse.

É pouco provável que o texto seja aprovado agora, defende o cientista. “O semestre acaba em julho. Pelo caminhar da questão, a ausência de relatoria e a existência de discordâncias até mesmo dentro do PT, o partido do presidente. acho muito pouco provável que se feche esse processo até mesmo nesst ano, já que temos as eleições em outubro”, disse.

Reuniões

As reuniões do Grupo de Trabalho serão de segunda a quinta-feira durante todo o mês de junho, com mais de uma audiência por dia. Serão ouvidos os setores da economia, além de técnicos do Ministério da Fazenda. O objetivo é que a Câmara aprove o projeto de regulamentação da reforma tributária ainda no primeiro semestre legislativo, ou seja, até o fim de julho. O GT tem 60 dias para concluir os trabalhos.

Foi o que afirmou o deputado Augusto Coutinho (Republicanos-PE), que presidiu a primeira das audiências. Ainda durante o debate, o secretário extraordinário da Reforma Tributária do Ministério da Fazenda, Bernard Appy, voltou a defender os principais pontos da proposta. Segundo ele, o impacto da mudança tributária na economia será sentido no médio prazo (entre 10 e 13 anos), e vai ajudar a reduzir a pressão por aumento de carga tributária.