Por: Ana Paula Marques

Saída de Moraes deve tornar TSE mais "calmo"

Moraes presidiu sua última sessão no TSE na quinta-feira (29) | Foto: Alejandro Zambrana/Secom/TSE

A última quarta-feira (29), foi marcada pela despedida do ministro Alexandre de Moraes como presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Apesar de o mandato só terminar na segunda-feira (3), foi a última sessão presidida por Moraes. Agora, sem a presença firme e de influência do ministro, especialistas disseram ao Correio da Manhã que esperam um perfil “mais calmo” da Corte Eleitoral.

Isso porque a ministra Cármen Lucia, que assume pela segunda vez a presidência da Corte, tem um perfil visto como mais técnico e discreto em comparação ao seu antecessor. Assim como Moraes, a ministra ficará com a função de comandar o colegiado durante um pleito eleitoral, mas com uma diferença. Ela comandará as eleições municipais de outubro desse ano, enquanto Moraes foi presidente da Corte Eleitoral durante as eleições nacionais e estaduais—para governador e presidente da República. Apesar da diferença, Cármen Lucia deve continuar algumas linhas de ação de Moraes, como o combate às fake news, tema que recebeu grande destaque nos últimos anos.

Na última sessão, a próxima presidente da Corte Eleitoral classificou Moraes como a “pessoa certa, no lugar certo e na hora certa”, ao relembrar sua atuação na condução das eleições de 2022. O ministro foi bastante elogiado por sua gestão.

Perfis

Mesmo com as diferenças, Cármem Lucia irá lidar com a mesma onda de polarização que tomou conta do país nos últimos anos, mesmo em eleições para as prefeituras. Em São Paulo, por exemplo, o levantamento divulgado na quinta-feira (29) pelo Datafolha mostra um empate na liderança do pleito entre o deputado federal Guilherme Boulos (Psol) e o prefeito Ricardo Nunes (MDB). Boulos, que é apoiado pelo PT e por Lula, tem 24%, e Nunes, que tem o apoio do PL e do ex-presidente Jair Bolsonaro, 23%.

Esse cenário, no passado, revelou o que Moraes declarou em sua última sessão no TSE como “populismo digital extremista”, além dos ataques ao processo eleitoral e até mesmo ao judiciário brasileiro.

Outro ponto que deve manter o “protagonismo” da Corte mais adormecido é que Cármen Lúcia tem a melhor avaliação entre os 11 integrantes do Supremo Tribunal Federal (STF), segundo pesquisa divulgada pelo instituto AtlasIntel, em parceria com o jornal O Estado de S. Paulo. A ministra é vista positivamente por 40% dos entrevistados. Apesar de vir em segundo lugar na lista, com 38%, Alexandre de Moraes foi atacado pelo público que hoje faz oposição ao governo de Luiz Inácio Lula da Silva.

Em prova

Para o advogado e consultor político-eleitoral Mateus Naves, o perfil de Cármen Lucia é marcado pela característica que se espera de um juiz. “Ela é uma ministra discreta, e muito bem avaliada na Corte por seu perfil técnico, com aparições e declarações públicas mais contidas e atuando apenas quando provocada nos processos. Tudo isso, no entanto, sem deixar de se posicionar firmemente na defesa das instituições e da normalidade democrática”, explica.

A prova da ministra, segundo o especialista, será menos intensa da que foi imposta ao ministro Moraes durante a última eleição. “Mesmo que as consequências da polarização nacional ainda reflitam muito nas eleições municipais, o pleito de outubro expõe menos o TSE à opinião pública, uma vez que os processos passam por várias instâncias e as discussões chegam mais amadurecidas à Corte, com maior protagonismo dos Tribunais Regionais Eleitorais de cada estado”, explica.

Serão três níveis de julgamento. Primeiro, as ações eleitorais irão passar pelos juízes eleitorais, segundo pelos Tribunais Regionais Eleitorais (TRE) e só então podem chegar no TSE.

Fake

Outra prova para a ministra, conforme a advogada especialista em direito público Evelyn Melo, será uma eleição ainda marcada pelo uso da inteligência artificial (IA), o que gera maior risco de adulterações como o deep fake—técnica que usa IA e outros conteúdos verdadeiros, como foto e vídeo, para criar falos conteúdos extremamente realistas. Isso desafiará a Justiça Eleitoral a retirar conteúdo com desinformação do ar, com a maior celeridade, para não afetar o processo eleitoral.

A saída de Moraes abre uma vaga no tribunal, e ela será ocupada por André Mendonça, indicado pelo ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), que sai da cadeira de ministro substituto para ocupar o cargo de titular na Corte. Ou seja, o TSE terá uma nova composição. O especialista em direito eleitoral Alberto Rollo, porém, considera que André Mendonça não deverá alterar de forma direta a atuação do TSE.

“Não vejo alternâncias na Corte na saída de Moraes, chamado de opositor de Bolsonaro, com a entrada de Mendonça, indicado por ele. O que víamos era a vontade do ministro Alexandre de Moraes de votar questões polêmicas, de não ter medo de se posicionar e de até mandar recados por meio de votos. André Mendonça tem perfil discreto, ele deve polemizar menos, mas se tiver que votar contra o ex-presidente, ele o fará, justamente por ter um perfil também bastante técnico”, explica.

Já a advogada especialista em direito eleitoral Iasmin Gonçalves, defende a importância de ressaltar que a Corte é composta por sete integrantes, sendo o ministro André Mendonça apenas um deles. Seu voto representa sua posição individual, e, para vir a prevalecer, é necessário que seu posicionamento seja apoiado pelos demais membros. Caso contrário, seu voto será apenas um voto isolado.