Por: Ana Paula Marques

STF fixa 40 gramas para diferenciar usuário de traficante

Decisão sobre quantidade é até definição do Congresso | Foto: Andressa Anholete/SCO/STF

Um dia após decidir descriminalizar o porte de maconha para uso pessoal, o Supremo Tribunal Federal (STF) definiu, na quarta-feira (26), que 40 gramas de maconha é a quantidade que diferencia o uso pessoal do tráfico de drogas. Com a definição, a Corte concluiu o julgamento sobre o tema.

Agora, quem for pego com até 40 gramas ou seis plantas-fêmea de cannabis será considerado usuário pela tese fixada e, quando flagradas portando maconha, não serão mais obrigadas a irem para a delegacia, nem terão que prestar penas como serviços à comunidade. Elas serão submetidas a medidas que não tenham caráter penal, mas sim considerado ato ilícito de natureza administrativa, ou seja, serão cumpridas determinações como o comparecimento a cursos educativos ou advertências sobre o uso de drogas.

Novamente, os ministros reforçaram que a decisão não legaliza o uso da maconha e Inclusive, a tese final aprovada diz que a droga será apreendida pela polícia. Até a decisão do Supremo, A Lei de Drogas não deixava claros quais são os critérios para definir usuário e traficante. Ou seja, na prática, acabava ficando a cargo das autoridades como polícia, Ministério Público e o juiz definir se a pessoa que está com drogas é usuário ou traficante.

Segundo os ministros, a definição pretende acabar com eventuais abusos de enquadramento de pessoas a partir de vieses parciais, sociais e, por vezes, até racistas. É o que explica o advogado criminalista e mestre em Direitos Humanos, Gabriel de Castro.

“Quando olhamos para o Brasil, percebemos principalmente que a forma abstrata ou subjetiva da nossa legislação permite a seleção de usuários, em especial negros e pobres, como sendo criminalizados como traficantes. E do Estado brasileiro, percebemos o quanto essa questão da guerra às drogas tem se tornado extremamente custosa, cara e de baixíssima eficiência, uma vez que se acaba criminalizando quem, na verdade, deveria estar sendo tratado com políticas de saúde pública”, disse.

Conscientização

Os ministros também sugeriram que o governo federal adote medidas de conscientização contra o uso de drogas. Para isso, a Suprema Corte determinou o descontingenciamentos de verbas do Fundo Nacional Antidrogas, com a permissão para uso do recurso na promoção de uma campanha massiva destinada aos jovens sobre os malefícios do consumo de drogas ilícitas. Como, por exemplo, aconteceu com as medidas para conscientização do malefícios do cigarro, considerada pelos ministros da corte, uma campanha que funciona.

Prática

A quantidade será o principal elemento para distinguir. Entretanto, os ministros reforçaram que a Justiça deve avaliar em cada caso outros elementos, chamados de 'presunção relativa' ao deparar com uma pessoa com drogas, independentemente da quantidade. O que significa, na prática, que se houver elementos de que a pessoa estava tentando vender maconha, mesmo com menos de 40 gramas, ela pode eventualmente ser enquadrada por tráfico. Um exemplo dado pelos ministros é que se uma pessoa for pega com, por exemplo, 30 gramas, mas também tenha com ela balança de precisão, ou se a quantidade estiver separada em trouxas, pode ser enquadrada penalmente porque isso seria indício de tráfico.

Outro ponto estabelecido pela Corte, é que ao ser pego com a droga, a polícia deve apreender, seja qual for a quantidade. Caso a autoridade policial tenha dúvida se a gramatura passe das 40 gramas ou se há indícios circunstanciais, o individuo será conduzido a uma delegacia e lá a droga será pesada. Após isso e somente comprovando o crime de tráfico, caberá ao delegado registrar o auto de prisão em flagrante. Depois, o caso será encaminhado imediatamente para o juizado criminal, onde o juiz irá analisar o caso para o afastamento da presunção de porte para uso próprio.

Congresso x STF

Com a descriminalização determinada pelo STF e mesmo com a tramitação de uma Proposta de Emenda a Constituição (PEC) que criminaliza o porte de qualquer quantidade e qualquer tipo de droga no Congresso Nacional.

O ministro Dias Toffoli frisou que assim que decidido pela Suprema Corte, o uso privado não poderá ser estabelecido como criminal pelo Congresso Nacional, mesmo que seja o Legislativo a definir a diferenciação do porte ou tráfico. A PEC de autoria do presidente do Senado Federal, Rodrigo Pacheco (PSD-MG) foi aprovada pela Casa com ampla maioria em abril, e na semana passada também ganhou o aval da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara dos Deputados. Agora, em um recado para o julgamento do STF, o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), criou uma comissão especial para debater uma proposta contrária à da Corte.

Nesse caso, a matéria ainda deve passar por uma comissão especial e só depois ir ao plenário.