PF irá elaborar nota contra projeto que restringe delações

Projeto que proíbe delação por pessoas presas segue em tramitação na Câmara

Por Gabriela Gallo

Andrei fará parecer defendendo instituto da delação premiada

Desenterrado na última semana pelo presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), segue a expectativa da Casa de votar em regime de urgência o projeto de lei que proíbe a delação premiada a pessoas presas. Inicialmente, era esperado que o plenário da Câmara fosse avaliar o projeto nesta terça-feira (11). Porém, a possibilidade foi descartada para os parlamentares focarem em outros temas, como o Programa Mover. No entanto, há chances da Casa avaliar o projeto de delação premiada ao longo da semana ou na próxima.

No entanto, enquanto o Congresso não discute a medida, nesta terça-feira (11) o Diretor-geral da Polícia Federal (PF), Andrei Rodrigues, declarou que a corporação irá elaborar uma nota técnica contra o projeto de lei. As informações são do site Metrópoles.

Ele disse que a corporação entregará a manifestação nos próximos dias, subsidiando o Ministério da Justiça e Segurança Pública (MJSP). “Nós respeitamos absolutamente o processo legislativo. Acho que o Parlamento é o ambiente certo para a discussão, que deve ouvir todas as partes interessadas. A delação é uma importante ferramenta na obtenção de provas”, disse.

Projeto

A delação premiada é um acordo entre o acusado e o Ministério Público, como representante do acusador. O acusado, na condição de delator, contribui com as investigações policiais ao abrir mão do seu direito ao silêncio e oferece informações de conhecimento dele que possam ajudar na investigação do caso. A medida é usada como uma moeda de troca para oferecer uma vantagem ao delator, geralmente com redução de pena.

O projeto foi proposto pela primeira vez em 2016 pelo ex-deputado Wadih Damous (PT-RJ) para proteger colegas do seu partido, tal como o então ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, de investigações feitas por delações durante a Operação Lava Jato. Todavia, apesar da base do texto ser a mesma, o projeto que será analisado no Congresso atrela a proposta com um outro projeto semelhante do deputado federal Luciano Amaral (PV-AL). A diferença é que o projeto de Amaral proíbe a delação premiada que não seja “voluntária” e para pessoas presas. Isso porque, na avaliação do parlamentar, a delação de pessoas privadas de liberdade não é voluntária, já que o preso estaria sendo pressionado para fazê-lo.

Portanto, por ter sido uma ideia original do PT, o ministro de Relações Institucionais, Alexandre Padilha, reforçou que os líderes do governo evitem discutir ou chamar atenção para a medida, já que ela é uma “saia justa” para a sigla e aliados do governo.

O projeto não deixa claro se a medida pode ou não anular delações premiadas já validadas. Portanto, ela abre brechas para derrubar investigações pelo caso do assassinato da vereadora Marielle Franco (PSOL-RJ) – já que a investigação vem se desenrolando pelas delações premiadas dos executores –, ou contra o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), investigado pelo suposto esquema de joias e por fraude no cartão de vacinação contra a Covid-19 por tentativa de golpe de Estado e atos antidemocráticos. A maior parte das acusações contra Bolsonaro decorrem da delação premiada acordada entre o ex-ajudante de ordens de Bolsonaro tenente-coronel Mauro Cid e a Polícia Federal.

Judiciário

Em entrevista ao programa Roda Viva, da TV Cultura, na noite desta segunda-feira (10), o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Luís Roberto Barroso, disse que, do ponto de vista jurídico, s delação premiada vem contribuindo com investigações de crimes com réus de alto poder aquisitivo ou poder. No entanto, ele reforçou que o debate que segue na Câmara trata de uma discussão política, e evitou se posicionar mais sobre o projeto.

“A colaboração premiada tem funcionado com as adequações que o Supremo impôs como uma ferramenta positiva, sobretudo em casos de colarinho branco [termo adotado para crimes não violentos, praticado por pessoas que tenha um cargo elevado de poder] e de desvio de dinheiro. Se não tiver uma pessoa de dentro do esquema ajudando a percorrer o caminho para localizar o dinheiro na Suíça, nas Bahamas, ou onde quer que ele esteja, tudo fica mais difícil. Eu acho que é um instituto positivo para a persecução penal legítima. Mas não cabe a mim interferir com debate político do Congresso”, disse Barroso.

“O fato de o réu estar preso não é em si o problema. Se ele estiver ilegitimamente preso para ser levado e induzido a [realizar] uma delação premiada, isso é inaceitável. Mas se ele está preso legitimamente e deseja abreviar o seu tempo de permanência fazendo uma delação com fatos verdadeiros e corroborada por outras provas, eu acho que é perfeitamente legítimo”, pontuou Barroso.