Por: Ana Paula Marques

"Abin paralela" teria monitorado ministros, políticos e jornalistas

Moraes e Gonet divergiram sobre as prisões ocorridas na quinta | Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil

Logo após a Polícia Federal (PF) fazer mais uma operação na manhã de quinta-feira (11), o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes tirou o sigilo de documentos referentes à operação. Os documentos apontam para a suposta existência da Agência Brasileira de Investigação (Abin) “paralela”. Mas apontam também uma divergência entre Moraes e o procurador-geral da República, Paulo Gonet, quanto à prisão de envolvidos.

O relatório da PF mostra que a “Abin paralela”, grupo suspeito de usar estrutura da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) para espionar adversários políticos do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), teria monitorado ministros da Suprema Corte, o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), seu antecessor, o ex-deputado Rodrigo Maia e alguns jornalistas. Entre os nomes, também estão ex-integrantes da CPI da Covid, como os senadores Renan Calheiros (MDB-AL) e Omar Aziz (PSD-AM).

Mesmo nomes que eram aliados do governo de então aparecem como investigados, Caso do deputado federal Kim Kataguiri (União Brasil-SP). Ou ex-aliados que depois romperam, como a ex-deputada federal Joice Hasselmann.

Áudio

As investigações também encontraram uma gravação de uma hora e oito minutos de uma reunião entre o então presidente Bolsonaro e o então chefe da Abin, o deputado federal Alexandre Ramagem (PL-RJ), em que discutiam um plano para proteger o senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ) de uma investigação. Também teria participado da reunião o ex-ministro do Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República (GSI), general Augusto Heleno. Segundo a apuração da polícia, o áudio comprovaria a atuação de Bolsonaro para usar a Abin a fim de atender a interesses próprios e de sua família.

No encontro, eles trataram sobre as supostas irregularidades cometidas pelos auditores da Receita Federal na confecção do relatório de inteligência fiscal que deu causa à investigação contra Flávio. Amigo de Bolsonaro, em junho, Ramagem foi o escolhido para chefiar a Abin.

Minuta do golpe

Ainda segundo as investigações, ao menos dois dos investigados presos na quinta tinham conhecimento sobre a existência de uma minuta de decreto para promover um golpe de Estado, que poderia ser assinada pelo ex-presidente Jair Bolsonaro.

No relatório a polícia disse ter achado, em diálogos mantidos entre o militar Giancarlo Gomes Rodrigues e seu superior, o policial federal Marcelo Araújo Bormevet—uma das principais base para a investigação— conversas trocadas entre os dois em que se destaca uma troca de mensagens. Bormevet pergunta a Giancarlo: “O Nosso PR imbrochável já assinou a p… do decreto?”. O militar responde: “Assinou nada. Tá f... essa espera, se é que vai ter alguma coisa”.

Segundo as investigações, os dois eram os responsáveis por operar diretamente o programa First Mile, adquirido pela Abin e capaz de monitorar o posicionamento geográfico de aparelhos celulares sem ser detectado pelo sistema de telefonia.

A "minuta do golpe", é o rascunho de um decreto golpista encontrado na casa do ex-ministro Anderson Torres, no fim de 2022, a existência do texto foi revelada à PF na delação do tenente-coronel Mauro Cid, ex-ajudante de ordens de Bolsonaro. O texto incluía ordens de prisão contra ministros do Supremo Tribunal Federal e a anulação das eleições de 2022, caso Bolsonaro não conseguisse a reeleição.

PRG

O documento aponta ainda para uma divergência. O Procurador-geral da República, Paulo Gonet, deu parecer contrário às prisões que acabaram sendo feitas pela PF nas investigações do esquema de espionagem ilegal. No documento, assinado na última segunda-feira (8), o procurador-geral afirma que não existem “fatos novos ou contemporâneos” que justificariam uma prisão preventiva dos investigados.

Moraes não seguiu o parecer, ao determinar as prisões. Ele citou a '”gravidade diferenciada” dos crimes investigados. Segundo o ministro, os alvos “possuem dados e variados contatos obtidos de forma ilícita” no período em que estiveram na Abin, e essas informações poderiam ser usadas por eles para atrapalhar as investigações.

Defesa

O senador Flávio Bolsonaro, disse ao Correio da Manhã, em nota, que não houve qualquer interferência da Abin para beneficiá-lo. “Simplesmente não existia nenhuma relação minha com Abin. Minha defesa atacava questões processuais, portanto, nenhuma utilidade que a Abin pudesse ter. A divulgação desse tipo de documento, às vésperas das eleições, apenas tem o objetivo de prejudicar a candidatura de Alexandre Ramagem à prefeitura do Rio de Janeiro”, defendeu. Ele também publicou um vídeo nas redes sociais onde defende os mesmo pontos.

A assessoria do deputado Alexandre Ramagem foi procurada pela reportagem, mas até o fechamento da edição, não houve resposta. Já a defesa do ex-presidente Bolsonaro disse que não iria comentar o caso.