CCJ adia votação de projeto que concede anistia a presos por 8/1

Estratégia governista funcionou e deve jogar projeto para depois das eleições municipais

Por Gabriela Gallo

Governistas conseguiram conter votação da anistia na CCJ

A Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara dos Deputados adiou a discussão do Projeto de Lei (PL) nº 2858/2022, que concede anistia a todos os presos envolvidos em atos antidemocráticos no período eleitoral de 2022. Inicialmente o projeto seria votado nesta terça-feira (10), mas foi adiado já que, por falta de acordo entre governo e oposição, a comissão não conseguiu discutir o tema antes início da Ordem do Dia do Plenário da Câmara. A presidente da CCJ, Caroline de Toni (PL-SC) tentará colocar o projeto em votação na quarta-feira (11) como item extrapauta. Mas a probabilidade é que projeto fique para depois das eleições municipais.

Desde o início, os parlamentares da base governista trabalharam para adiar ao máximo a votação. Antes da sessão, tentaram incluir dois projetos extrapauta para tentar adiar a discussão da anistia. O requerimento não foi aceito pela comissão, mas foi o suficiente para atrasar a discussão do tema. Pouco depois, os deputados Chico Alencar (PSOL-RJ) e Patrus Ananias (PT-MG) encaminharam um pedido de retirada de pauta da sessão, que também foi negado, mas novamente atrasou a sessão.

Pedido de vista

Considerando que o projeto seja anexado e aprovado como item extrapauta desta quarta, a expectativa é que, após a leitura do parecer, a base governista encaminhe um pedido de vista (mais tempo para análise do projeto). Assim, bastidores apontam que os membros da comissão esperam que a proposta só venha agora a ser votada pela CCJ após o primeiro turno das eleições municipais, em 8 de outubro.

Durante a sessão, o líder do governo na Câmara dos Deputados, deputado José Guimarães (PT-CE), defendeu que o tema fosse discutido após as eleições municipais por se tratar de um tema extenso e complexo. No entendimento do parlamentar, o ideal seria formar uma comissão especial para tratar da questão.

Bate-bocas

A sessão de terça-feira foi calorosa e marcada por diversos momentos de bate boca entre governo e oposição, sendo necessárias diversas intervenções da presidente da comissão, deputada Caroline De Toni (PL-SC). Parlamentares da oposição defenderam a necessidade de anistia para os presos nos atos contra os três poderes, citando a morte de Cleriston da Cunha (conhecido como Cleuzão) como exemplo. Ele morreu na penitenciária de Brasília (Papuda) devido um infarto fulminante, em novembro de 2023. Antes da sua morte, a defesa de Cleuzão solicitara que ele fosse solto por sofrer com uma série de comorbidades – decisão que não foi acatada pelo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes. A família de Cleuzão estava presente na sessão e pediu justiça por sua morte.

Em uma “terceira via”, o deputado Arthur Maia (União-BA), que foi o presidente da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) que tratou dos atos antidemocráticos disse que não considera o que aconteceu em 8 de janeiro como uma tentativa de golpe de Estado, mas reconheceu que foram cometidos crimes no dia. E, nesse meio campo, ele seguiu o pensamento que a CCJ deveria votar o projeto pós eleições municipais. “Nós do União Brasil temos deputados que querem votar a favor, outros que querem votar contra, mas uma coisa é certa: este não é o momento apropriado para este debate. É isso que nós pleiteamos aqui: que este debate não seja contaminado pelas eleições”, destacou.

8 de janeiro

O projeto original concedia anistia a todos os que tivessem participado do que vem sendo classificado como atos antidemocráticos desde 30 de outubro de 2022. Isso incluiria, portanto, a tentativa de invasão da Polícia Federal e quebradeiras ocorridas na diplomação de Luiz Inácio Lula da Silva como presidente eleito no dia 12 de dezembro e mesmo a tentativa de atentado com uma boma colocada em um caminhão em frente ao Aeroporto de Brasília na véspera do Natal de 2022. O testo substitutivo do relator Rodrigo Valadares (União-SE), no entanto, limitou o período ao dia 8 de janeiro de 2023 até a data da vigência da lei. Neste dia, ocorreu a invasão e depredação dos prédios dos três poderes.

Antes, o projeto ampliava a anistia a qualquer “manifestante, caminhoneiro, empresário e todos os que tenham participado de manifestações nas rodovias nacionais, em frente a unidades militares ou em qualquer lugar do território nacional” a partir do dia 30 de outubro de 2022. Com a alteração, o texto não engloba mais figuras como o empresário Alan Diego dos Santos Rodrigues, condenado por armar a bomba na entrada do Aeroporto de Brasília em dezembro de 2022.

Para a reportagem, o advogado especialista em direito penal Oberdan Costa destacou que, apesar de a anistia ser um “instrumento usado para a pacificação social”, na atual conjuntura é duvidoso que seja o momento para perdões, “uma vez que as investigações sequer foram concluídas, pendentes ainda linhas de apuração que levariam a mais culpados”, que ainda não estão conhecidos.

“É duvidoso que seja constitucional, do ponto de vista principiológico, usar a anistia em favor de quem tentou acabar com a própria Constituição”, completou o advogado.

Na avaliação do especialista em direito penal, a medida poderia ser útil para as pessoas que foram presas sem usar da violência contra pessoas ou objetos ou aquelas que “não tiveram suas condutas claramente delineadas na denúncia”.

“[Com isso] poderia até haver algum acerto na medida, uma vez que a dosimetria das penas, para estas pessoas, tem causado críticas da comunidade das ciências penais. Alega-se que as condenações do STF consideraram cumulativamente as penas de crimes que, em teoria, não deveriam estar cumuladas”, pontuou.