Por: Karoline Cavalcante

Divisão da direita brasileira se intensifica após eleições

Grupos de Bolsonaro e direita mais moderada se dividiram | Foto: Valter Campanato/Agência Brasil

As eleições municipais de 2024 revelaram uma divisão mais acentuada na direita brasileira. Fragmentada em diferentes correntes ideológicas e lideranças, o espectro ideológico não apresenta mais uma estratégia unificada nas disputas. Essa é a avaliação do professor de Ciência Política da Universidade de Brasília (UnB), Joscimar Souza Silva.

Segundo o especialista, as disputas externas refletem uma separação entre uma direita mais moderada e outra mais radical, visível para o eleitorado. Além disso, existem fragmentações internas nos partidos, como a disputa pelo controle do PL entre o ex-presidente Jair Bolsonaro e o atual presidente do partido, Valdemar Costa Neto.

“Outras disputas de poder estão em jogo, envolvendo liderança e controle de grupos políticos e do eleitorado. Um exemplo são os líderes da Frente Parlamentar Evangélica, que ora se aliam a Bolsonaro ora se aproximam de grupos mais tradicionais da direita”, comentou Silva.

“Esses grupos buscam o controle total do eleitorado de direita, disputando entre si a autonomia e o controle regional ou local do poder político, ao mesmo tempo em que observam as dinâmicas da disputa eleitoral nacional que ocorrerá nas eleições de 2026”, acrescentou o professor.

Goiânia

Goiânia, capital do estado de Goiás, acabou se tornando o foco mais evidente dessa divisão. O prefeito eleito Sandro Mabel (União) não hesitou em criticar Bolsonaro, que havia declarado apoio ao seu adversário, Fred Rodrigues (PL). Mabel caracterizou o apoio de Bolsonaro como um “presente de grego” para a cidade, afirmando que os candidatos por ele apoiados “levaram couro”.

“O presidente Bolsonaro veio aqui e deu um presente de grego para Goiânia, porque esse candidato não tem a menor experiência. Além de mentir — e sabemos que quem mente frequentemente também rouba — é uma pessoa completamente despreparada. Nunca conseguiu justificar onde trabalhou”, afirmou Mabel.

“O Bolsonaro perdeu em quase todos os lugares, entende? Exatamente porque os candidatos dele não eram bons. Eles lideravam nas eleições, mas tomaram uma surra no segundo turno. A cidade de Goiânia não quer extremistas, quer alguém com capacidade de gestão”, completou.

O governador de Goiás, Ronaldo Caiado (União), que apoiou o prefeito eleito, classificou Bolsonaro como “deselegante” em relação a parte de seus apoiadores nas eleições municipais. Caiado afirmou que buscou dialogar com o ex-presidente, mas sem sucesso. As duas declarações foram feitas em entrevista à GloboNews.

Em coletiva de imprensa no Senado Federal nesta terça-feira (29), Bolsonaro rebateu as críticas de Caiado, afirmando que ele não aceita ser contrariado. “O Caiado é uma pessoa que, se você o desagrada, ele se torna seu inimigo. Em quatro ocasiões, ele rompeu comigo durante minha Presidência. Uma dessas vezes foi agora, pois ele tinha um candidato e eu tinha outro”, declarou.

Os políticos eram aliados até o rompimento da relação durante a pandemia de covid-19. Caiado, que é médico, defendeu o isolamento social, enquanto Bolsonaro pedia o fim das restrições.

São Paulo

A capital paulista também foi palco de intensas disputas eleitorais na direita. No primeiro turno do pleito municipal, dois dos principais candidatos à prefeitura, o reeleito Ricardo Nunes (MDB) e o então candidato Pablo Marçal (PRTB), apresentavam divergências dentro do mesmo campo político.

Em seu discurso de vitória, Nunes, que recebeu apoio de Bolsonaro durante a campanha, atribuiu a reeleição ao governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos). “Agradeço ao líder maior, sem o qual esta vitória não teria sido possível. Meu amigo, que me estendeu a mão na hora mais difícil”, disse.

Por outro lado, mesmo contra a vontade de Bolsonaro, Marçal concentrou seu discurso no eleitorado do ex-presidente e conquistou uma parte significativa dos votos.