Lula admite desempenho ruim do PT e prega mudanças

Ao Correio, analistas dizem que resultado foi negativo, mas sem surpresas

Por Gabriela Gallo

Lula avalia que partido vai precisar rediscutir suas estratégias

Quase após o primeiro turno das eleições municipais, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) reconheceu que o Partido dos Trabalhadores não teve um bom desempenho na disputa eleitoral. Em entrevista à rádio O Povo/CBN, em Fortaleza (CE), na sexta-feira (11), o presidente da República disse que o partido precisa “rediscutir” o seu papel eleitoral.

“Temos que rediscutir o papel do PT. Hoje, 80% dos prefeitos [petistas] foram eleitos em cinco estados, todos do Nordeste. Tivemos boa participação no Rio Grande do Sul e em Minas Gerais ganhamos as que já governamos [Juiz de Fora e Contagem], mas não fomos bem em São Paulo. Perdemos São Bernardo do Campo, Santo André, perdemos inclusive Araraquara, onde tínhamos certeza de que íamos ganhar”, afirmou.

Mudanças

E, nessa rediscussão, o partido precisa refletir e mudar seu discurso sobre as mudanças do mercado de trabalho – no qual muitos eleitores têm optado por trabalhar por conta própria e sem carteira assinada. Segundo Lula, a falta de atualização do partido nesse atual cenário tem afastado a legenda dos trabalhadores.

“Precisamos adequar o nosso discurso ao mundo do trabalho, que não é só a carteira profissional assinada. É o cara que quer trabalhar em home office, é o cara que quer ser um pequeno empreendedor, é o cara que quer ter um pequeno comércio, é o cara que quer trabalhar por conta própria”, reiterou Lula.

Na avaliação do cientista político Isaac Jordão, o PT apresenta maiores dificuldades em conversar com o eleitorado urbano na faixa de renda entre dois salários-mínimos (atualmente R$ 2.824) e cinco salários-mínimos (R$ 7.060). “Este público foi o que mais sofreu com a crise econômica que começou em 2013 e que ainda está em uma situação que é muito vulnerável a mudanças na economia. Ao mesmo tempo é um eleitorado cuja confiança o PT não tem conseguido reconquistar”, disse ao Correio da Manhã.

Para a reportagem, o consultor em análise política da BMJ Consultores Associados Érico Oyama reforçou que o PT é um partido de raiz sindical, “de luta por maiores direitos de trabalhadores formais”.

“No entanto, há uma parcela significativa hoje de pessoas de classe média e baixa que são profissionais liberais e atuam sem carteira assinada. Essas pessoas buscam um menor peso do Estado na atuação do setor privado, e não pagar mais impostos para haver maiores garantias aos trabalhadores CLT”, destacou o analista político.

Para a reportagem, o cientista político Márcio Coimbra avaliou que o partido não se modernizou considerando a realidade econômica do país e a realidade social do mundo – inclusive por não trocar suas lideranças, mantendo as mesmas da década de 1980, sem conseguir seguir em frente. “Não surgindo novas lideranças, não se tem novas ideias. Não se tem uma esquerda alinhada com os desafios do mundo moderno. O PT está preso ao passado e se continuar assim ele vai continuar perdendo eleitores. Se não encontrar uma renovação vai continuar perdendo eleitores e vai acabar com um fim melancólico. Eu não vejo a possibilidade do Lula se reelegendo em 2026 dentro desse cenário”, afirmou.

Coimbra destacou que “as pautas da esquerda moderna no mundo são outras” das propostas pelo PT, citando como exemplo o governo chileno, que tem se mantido firme na pauta de defesa aos direitos humanos condenado tanto ditaduras da esquerda (Venezuela) quando da direita (El Salvador).

Mau desempenho

Nestas eleições, o PT elegeu 248 prefeitos no primeiro turno, ficando na nona posição do ranking geral de partidos. A sigla tem mais 13 candidatos disputando o segundo turno.

Érico Oyama completou que o desempenho do PT nesta disputa eleitoral evidência que “em 2022, houve uma vitória de Lula e da coalizão formada para derrotar Bolsonaro, e não um êxito da esquerda”.

“Também é preciso considerar que a taxa de reeleição foi muito alta e havia muitos partidos de centro-direita no poder. Ou seja, parte do bom desempenho dos partidos de centro-direita deve-se a um fator inercial”, ponderou.

Por outro lado, o cientista político Tiago Valenciano não considera surpresa o baixo desempenho do PT em eleições locais. “Tradicionalmente, o PT não consegue um bom desempenho nas eleições municipais, exceto no primeiro período do Lula. Com a dificuldade de filiação na lógica municipal, em que é complexo encontrar filiados com a predisposição de eleger vereadores, além da articulação da própria formação de chapa, fica difícil encontrar o perfil do PT para defender uma bandeira nacional em uma eleição local”, afirmou.