Após as notícias do inquérito da Polícia Federal (PF) que indicia mais de 30 militares por estarem envolvidos em uma tentativa de golpe de Estado nas eleições de 2022 em decorrência da derrota do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), seguem as investigações sobre o caso. E enquanto se espera as cenas dos próximos capítulos do caso, há a possibilidade de duas Propostas de Emenda à Constituição (PECs) voltarem à tona dos debates parlamentares.
Circula na Câmara dos Deputados a PEC 21/2021, que proíbe militares da ativa a ocuparem cargos de natureza civil na Administração Pública – seja no Executivo ou Legislativo, já que militares da ativa não podem atuar no poder Judiciário. Se aprovado da forma que se encontra, o texto acrescenta os dispositivos ao artigo 37 da Constituição, já que atualmente a Carta Magna não trata da presença de militares em cargos civis.
O projeto passou por uma longa tramitação na Casa. Atualmente, ele aguarda a que a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) designe um novo relator da proposta. Inicialmente, a relatora era a deputada federal Sâmia Bonfim (Psol-RJ), que foi escolhida em 2023. Porém, quando o texto foi apreciado pela CCJ, em 6 de março deste ano, a parlamentar não era mais membro da comissão (ela saiu em 4 de fevereiro) e, por isso, o texto carece de um novo relator.
Porém, em decorrência do novo episódio de tentativa de golpe de Estado envolvendo militares, segue a expectativa se o texto voltará a ser apreciado na Casa. Na avaliação do cientista político Melillo Dinis, a operação da Polícia Federal “volta a agitar os debates do tema no Congresso”, porém, a PEC não deve avançar momentaneamente, já que o atual foco dos parlamentares são as eleições internas.
“A grande prioridade do Congresso Nacional é a eleição dos presidentes da Câmara e do Senado, e isso é um tema de potencial polêmica que pode gerar algum grau de perturbação nesse modelo que foi escolhido – de fazer eleições quase por unanimidade do presidente da Câmara e do Senado, em fevereiro. Depois disso, a depender de como o Supremo [Tribunal Federal] vai retomar essa questão e vai levar adiante todas as investigações, é possível que isso ganhe força no Congresso”, declarou Melillo ao Correio da Manhã.
Questionado pela reportagem, o cientista político Tiago Valenciano concordou com Dinis. Para Valenciano, no momento, o foco das autoridades será “entender o que aconteceu em relação a essa possibilidade de ataque, ao STF e a presidência da República, para depois pensar em medidas mais severas quanto a participação de militares no poder”.
“Então a chance de ser aprovado neste momento não vejo como pauta prioritária e também não vejo a possibilidade de aprovação se a pauta vier acontecer, no sentido de que a maioria da Câmara dos Deputados, sobretudo, está mais alinhada à direita e esses militares quando disputam as eleições, buscam partidos, ideologicamente falando, mais alinhados à direita. Então o cenário no momento é bem isolador no sentido de vir a aprovar essa PEC”, afirmou o cientista político.
Senado
Em conversa com a reportagem, o cientista político André Cesar lembrou que circula no Senado outra Proposta de Emenda à Constituição semelhante. A PEC 41/2023 altera as condições de elegibilidade por militares da ativa das Forças Armadas. A medida propõe que, para concorrer a um cargo eletivo, o militar da ativa tem que passar imediatamente para a reserva.
“Então nesse caso, a coisa mudou de figura. Agora tem que ver como vai se manter a fervura desse debate, como vai ficar essa situação. Pode ser aprovado? Pode. Como pode não ser aprovado. Toda emenda constitucional é difícil de passar. Militares tem ainda tem muito peso na sociedade”, ponderou Cesar.
Todavia, ele destacou que os inquéritos da PF e as investigações sobre tentativa de golpe de Estado pesam nas expectativas de ambas as PECs serem aprovadas, ou não. “As condições começam a mudar, ventos novos sopram. Então a gente vê hoje novas situações e os eventos recentes mostram que algo pode ocorrer, algo mais sério, no sentido de que tanto a PEC da Câmara quanto a do Senado podem voltar a ganhar peso, um peso que não se via desde sempre”, afirmou.