Após o governo divulgar o novo pacote fiscal, o Congresso Nacional recebeu a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 45/2024 que traz as medidas restantes do pacote de corte de gastos. O texto foi enviado pelo Ministério da Fazenda na noite de segunda-feira (2). Nesta terça-feira (3), o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), encaminhou o texto para a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Casa, que designará um relator para a medida.
Dentre as mudanças propostas está a restrição gradual do acesso ao abono salarial de trabalhadores que contribuem com o pagamento do Programa de Integração Social (PIS) ou para o Programa de Formação do Patrimônio do Servidor Público (Pasep). A medida garante abono salarial a funcionários contratados por carteira assinada ou servidores públicos que recebam até dois salários-mínimos mensais, atualmente cotado em R$ 2.640.
A partir de 2026, o valor será reajustado baseado na variação anual do Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC). Em outras palavras, o valor deixará de incorporar o ganho de salário-mínimo. Na prática, a medida passará por uma redução de um salário-mínimo e meio.
O consultor de Orçamento da Câmara dos Deputados Paulo Bijos avaliou que a redução gradual do acesso ao abono salarial não é uma solução adequada. “O abono salarial tem uma potência muito reduzida para a redução de desigualdades. Isso é simples de entender. Se alcança quem já está contemplado pela atividade produtiva, realmente não são os mais hipossuficientes”, afirmou em entrevista à rádio Câmara.
Projetos do pacote
Além da PEC, as medidas do pacote fiscal foram divididas em outros dois projetos, um projeto de lei (PL) e um projeto de lei complementar (PLP).
Na última semana, o governo encaminhou ao Congresso o PL 4614/2024, que altera os ajustes do salário-mínimo ao limite do arcabouço fiscal. Com isso, o projeto propõem que o salário-mínimo continue crescendo acima da inflação, mas limitado a um crescimento entre 0,6% a 2,5%. Atualmente, o salário-mínimo é reajustado pelo INPC mais a variação do PIB (Produto Interno Bruto) brasileiro de dois anos atrás. Portanto, caso o PL seja aprovado da forma que se encontra, o reajuste limitado ao arcabouço fiscal permanecerá até 2030.
Todavia, o consultor de Orçamento da Câmara Paulo Bijos considerou a medida como “tímida”.Ele destacou que a estratégia do governo de alterar o reajuste do salário da variação do PIB para o arcabouço fiscal representará uma redução apenas de 2,9% para 2,5%.
O PL 4614 ainda impõe um pente-fino nos beneficiários do Bolsa Família, do Benefício de Prestação Continuada (BPC) e benefícios e seguridades sociais da atualização do Cadastro Único (CadÚnico).
Além disso, o governo também encaminhou o PLP 210/2024 que altera o arcabouço fiscal e “institui regime fiscal sustentável para garantir a estabilidade macroeconômica do País e criar as condições adequadas ao crescimento socioeconômico”. A medida autoriza o Executivo a limitar o uso de créditos tributários em caso de suposto déficit nas contas públicas.
O limite para uso de créditos tributários será mensal e diferenciado de acordo com o tamanho da compensação. Não serão atingidos os créditos de até R$ 10 milhões. Em eventuais situações de déficit fiscal, o texto também proíbe a concessão, ampliação ou prorrogação de incentivos fiscais e o aumento das despesas com pessoal acima do limite inferior do arcabouço; ou seja, 0,6% acima da inflação.
O PLP ainda permite que o governo faça o bloqueio e o contingenciamento de emendas parlamentares até a mesma proporção aplicada às demais despesas discricionárias – ambos limitados a 15% do valor. A recente Lei Complementar 210/2024, que altera as regras de transferência das emendas parlamentares, estabelecia o contingenciamento dos recursos, mas não o bloqueio.
PEC paralela
Paralelamente aos projetos do governo, parlamentares da oposição articulam uma PEC que determina acabar com o abono salarial a partir de 2032, reduzindo imediatamente o acesso para quem ganha até um salário-mínimo. A medida está sendo desenvolvida pelos deputados federais Julio Lopes (PP-RJ), Kim Kataguiri (União-SP) e Pedro Paulo (PSD-RJ).
Para o consultor de Orçamento da Câmara dos Deputados Ricardo Volpe, essa PEC paralela é mais interessante que o projeto do governo em reduzir o abono salarial de dois salários-mínimos para um e meio. De acordo com o consultor, a medida considera um eventual envelhecimento da população.
“Se você tem uma despesa de R$ 1 trilhão – que são os benefícios –, que cresce de forma real 6%, enquanto que a receita do Estado está crescendo em torno de 3%, esse descasamento vai retirar as demais políticas públicas do Orçamento e vai haver um estrangulamento de diversas políticas”, declarou em entrevista à rádio Câmara.