Pacote fiscal deve ser aprovado, mas com mudanças

Ao Correio, especialistas avaliam que FCDF e teto de supersalários podem ser revistos

Por Gabriela Gallo

Urgência passou. Já o pacote exigirá novo empenho do governo

Após o plenário da Câmara dos Deputados aprovar o regime de urgência do Projeto de Lei (PL) 4614/2024 e do Projeto de Lei Complementar (PLP) 210/2024, que compõem o pacote de gastos proposto pelo governo federal, especula-se como serão firmados os textos no Congresso e quando a Casa votará a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 45/2024.

A urgência para os dois projetos foi aprovada na noite de quarta-feira (4), horas depois de o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), afirmar durante o dia que o governo não tinha votos suficientes. Os projetos foram aprovados com, respectivamente, 267 votos e 260 votos, no limite, portanto, demonstrando a dificuldade do governo, já que eram necessários no mínimo 257 deputados em ambos os textos.

Porém, mesmo que a urgência dos projetos tenha sido aprovada, isso não quer dizer que eles permanecerão da forma como se encontram, visto que há diversos pontos considerados polêmicos em todos os projetos.

Aprovação?

A consultora de Legislativo da BMJ Consultores Associados Letícia Mendes avalia que todos os projetos que envolvem o pacote de gastos serão aprovados ainda neste ano, como prevê o governo. A tramitação de propostas de emenda à constituição costuma gerar mais dificuldades. Contudo, Arthur Lira já informou que irá juntar a PEC 45/24 a outra PEC que já esteja em estágio avançado de tramitação para poder acelerar a sua tramitação.

“A grande dificuldade vai ser a maneira que esse texto vai ser aprovado. O governo vai ter o trabalho de articular sua base. De certa forma [Lira] também vai estar interagindo com as bancadas para trazer à tona porque o tema não interessa somente ao governo, mas também ao próprio Congresso”, disse ao Correio da Manhã.

Já o cientista político Mateus Oliveira não acredita que todas as medidas sejam aprovadas até o final do ano. “Atualmente, o cenário mais otimista mostra a aprovação pelo menos do PL do reajuste do salário-mínimo e do PLP dos gastos tributários neste ano”, avalia, tendo menos crença na possibilidade de aprovação a tempo da PEC dos Gastos. “O governo corre contra o tempo para alterar a regra do salário-mínimo antes do início do ano para evitar ter que corrigir o valor durante o ano vigente. A aprovação, entretanto, vai depender de um entrosamento maior entre Planalto e Parlamento – o que não temos visto até agora”, destacou a reportagem.

O advogado especialista em relações governamentais Isaac Simas destacou que “havendo interesse e vontade do Congresso em aprovar [a PEC], eles vão aprovar”.

“Como fizeram em anos anteriores, porque tinha uma unidade de interesse na aprovação delas. Mas não é exatamente o caso de agora, quando se está mexendo com o interesse de atores diversos”, pontuou.

Questionado pela reportagem, ele destacou que os principais entraves são referentes às emendas parlamentares, à alteração da correção de repasses para o Fundo Constitucional do DF (FCDF) e o limite de adicionais para o teto do funcionalismo público.

O Fundo Constitucional do DF corresponde a quase 40% do orçamento da capital federal. O governo propõe alterar a correção – atualmente corresponde à arrecadação do governo – considerando o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), principal indicador que mede a inflação no Brasil. O tema enfrenta forte resistência de parlamentares do DF.

“Querendo ou não, pelo Congresso estar no Distrito Federal, se tem uma grande força de lobby do governador, da OAB, dos sindicatos e de órgãos que funcionam com o dinheiro desse fundo, por exemplo o judiciário brasiliense, as polícias. Todos são contra esse tipo de alteração. Isso pode até passar, mas talvez haverá um meio termo entre o formato atual e o que eles estão querendo”, afirmou o advogado.

Judiciário

Outro tema polêmico do pacote fiscal, proposto na PEC, é a limitação de verbas remuneratórias ao teto do funcionalismo público, hoje em R$ 44.008,52. A medida visa limitar penduricalhos e benefícios extra-teto a esse valor.

A medida não foi bem recebida pelo poder Judiciário. Como adiantou o Correio da Manhã, na coluna Magnavita, uma nota conjunta de diversas entidades do Judiciário afirmam que “aproximadamente 40% dos magistrados que já preenchem os requisitos para aposentadoria podem optar pela saída imediata caso a PEC seja aprovada, impactando diretamente a magistratura nacional e podendo gerar graves consequências institucionais e sociais”.

Diante disso, especialistas avaliam que as chances da medida ser aprovada são baixas, ou, no mínimo, exigirão uma extensa negociação.

“Quando se mexe com o topo do funcionalismo público as articulações dentro da Casa [Câmara ou Senado] mudam. São categorias que possuem uma interação muito direta com os parlamentares. Pode ser um ponto relevante para poder observar e ter mais dificuldade”, destacou Letícia Mendes.