O anúncio do interesse do cantor sertanejo Gusttavo Lima em concorrer à presidência da República em 2026 dividiu opiniões, especialmente de parlamentares da direita e ligados à ala bolsonarista. O deputado federal Nikolas Ferreira (PL-MG) elogiou a iniciativa do cantor e foi acompanhado dos senadores Alessandro Vieira (MDB-SE) e Cleitinho Azevedo (Republicanos-MG). Já outros congressistas, como os deputados Capitão Alberto Neto (PL-AM) e José Medeiros (PL-MT), desaprovam a ideia.
Para além dos parlamentares, o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e o governador de Goiás Ronaldo Caiado (União Brasil) se sentiram “traídos” com o anúncio do sertanejo – que manifestou apoio a ambas as figuras políticas em eleições passadas. Apesar do sentimento de traição, Caiado disse que vê com “normalidade” a possível candidatura do cantor. Tanto Bolsonaro quanto Caiado estão inelegíveis por abuso de poder político, segundo o Tribunal Superior Eleitoral (TSE).
Base eleitoral
Apesar do possuir um forte apelo popular similar ao ex-coach Pablo Marçal (PRTB), que concorreu à prefeitura de São Paulo nas eleições municipais de 2024, Gusttavo Lima ainda tem um longo caminho para construir uma base eleitoral.
Para a reportagem, a especialista em comunicação política e marketing político Andressa Kammoun destacou que, apesar do sentimento inicial de traição de Bolsonaro e Caiado poder ser um impeditivo para o cantor, caso Lima demonstre ter um verdadeiro potencial de captação de votos, eles devem mudar de ideia de oferecer apoio político ao cantor.
“A política brasileira é historicamente marcada pela volatilidade de alianças, que frequentemente se ajustam a interesses estratégicos. Se Gusttavo Lima demonstrar viabilidade eleitoral, é provável que ambos reconsiderem suas posições e busquem reaproximação, independentemente de ressentimentos iniciais. Um exemplo notável foi a aliança entre Lula e Geraldo Alckmin em 2022, que superou décadas de oposição mútua e resultou em uma chapa vitoriosa”, explicou Kammoun.
A comunicadora ainda destacou que essas alianças políticas são de grande importância para a eleição deixar de ser um sonho para o “embaixador” (nome dado a Lima pelos fãs do cantor). “Silvio Santos, em 1989, enfrentou desafios judiciais e políticos que inviabilizaram sua campanha. Já Luciano Huck, apesar de cogitar candidaturas em 2018 e 2022, não conseguiu consolidar alianças amplas o suficiente para sustentar um projeto eleitoral. Esses exemplos destacam que figuras públicas fora da política tradicional precisam construir pontes com lideranças para aumentar suas chances de sucesso”, ela exemplifica.
A especialista em comunicação política ainda destaca que tanto Bolsonaro quanto Caiado podem aproveitar a candidatura de Gusttavo Lima para se promoverem e “manter sua relevância política, mesmo inelegíveis”. Porém, o cantor tem que tomar cuidado para não ter sua candidatura “percebida como subordinada a esses padrinhos políticos, limitando sua autonomia e seu apelo a eleitores mais independentes ou críticos ao status quo”.
Questionada pela reportagem, Andressa Kammoun avalia que, apesar de Gusttavo Lima ter um apelo popular tal como Pablo Marçal, eles têm campanhas políticas diferentes. “O contexto político, o perfil de suas bases e o alcance de suas mensagens são significativamente diferentes. Marçal, apesar de sua habilidade em mobilizar nichos específicos, enfrentou dificuldades em transcender esses grupos e atingir um público mais amplo, obtendo apenas 244 mil votos em sua tentativa presidencial. Gusttavo Lima, por outro lado, possui um capital cultural e popular muito mais amplo, consolidado por sua trajetória musical e conexão emocional com o público. Sua campanha deve explorar essa amplitude, utilizando sua história pessoal e seu alcance nacional para construir uma narrativa robusta e inclusiva”, destacou.