O anúncio da empresa Meta (responsável por administrar as redes sociais Facebook, Messenger, Instagram e WhatsApp) no sentido de acabar com o sistema de checagem de informações falsas gerou grande repercussão nacional e internacional. No Brasil, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) agendou uma reunião com membros do governo na sexta-feira (10) para tratar sobre o assunto. Nesta quinta-feira (9), o presidente se manifestou sobre o anúncio da big tech, classificando-o como “extremamente grave”.
“Eu acho que é extremamente grave as pessoas quererem que a comunicação digital não tenha a mesma responsabilidade de um cara que cometa um crime na imprensa escrita. É como se um cidadão pudesse ser punido porque faz uma coisa na vida real e não pudesse ser punido porque faz a mesma coisa na digital”, declarou Lula à imprensa.
Na terça-feira (7), o dono da Meta, o bilionário Mark Zuckerberg anunciou que as redes sociais gerenciadas pela empresa passarão a adotar o sistema de “notas de comunidade” que repassa aos usuários da própria rede social a tarefa de explicar ou desmentir algum assunto, podendo incluir links e imagens para exemplificá-la, e essa explicação é votada pelas outras pessoas. Em um pronunciamento, Zuckerberg destacou que a medida visa garantir total “liberdade de expressão” entre os usuários das redes.
Porém, em uma nota conjunta dos checadores de fatos pelo mundo a Mark Zuckerberg, divulgada nesta quinta-feira, eles esclarecem que a própria Meta nunca concedeu aos checadores “a capacidade ou a autoridade para remover conteúdos ou contas” de usuários. “A realidade é que a equipe da Meta decidia como e se os conteúdos apontados como falsos pelos verificadores deveriam ser removidos, freados ou rotulados. Vários checadores, ao longo dos anos, sugeriram à Meta melhorias nessa rotulagem, para que ela fosse menos intrusiva e evitasse até mesmo a aparência de censura, mas a Meta nunca agiu sobre essas sugestões”, declara a nota.
Repercussão
O poder Judiciário também demonstrou preocupação com as mudanças anunciadas. Durante o evento em memória aos dois anos dos atos antidemocráticos de 8 de janeiro, o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes declarou que a Suprema Corte não permitirá que as big techs “continuem sendo instrumentalizadas, dolosa ou culposamente, ou ainda somente visando lucro, instrumentalizadas para ampliar discursos de ódio”. Moraes reforçou que as redes podem atuar no Brasil, desde que respeitem a Constituição brasileira. O Ministério Público Federal (MPF) concedeu 30 dias úteis para o escritório da Meta no Brasil se manifestar quando o fim do sistema de checagem também será aplicado no Brasil.
Ao Correio da Manhã, o professor e especialista em Marketing e autor de Mais Marketing, Menos Guru (DVS Editora), Nino Carvalho, avaliou que “ao abandonar a checagem de fatos, a Meta não apenas reduz custos, mas também abre espaço para que grupos privados e políticos manipulem informações sem restrições”.
“A tendência é que mesmo pessoas com alto grau de discernimento e literacia digital tenham mais dificuldade para identificar o que é verdadeiro ou falso. A sofisticação tecnológica permitirá a criação de conteúdos manipulados, como vídeos e áudios que simulam discursos de figuras públicas com precisão quase imperceptível, alterando palavras ou contextos para distorcer informações. Além disso, as redes sociais estarão mais vulneráveis à disseminação de imagens grotescas, vídeos violentos e notícias falsas de caráter criminoso ou sensacionalista, muitas vezes apoiadas em ‘pesquisas’ e ‘dados’ inventados, o que aumentará o fluxo de desinformação”, destacou Carvalho.
Discurso de ódio
Dentre as mudanças com as novas diretrizes anunciadas pela Meta, a partir de agora, estão autorizados insultos, além de pedidos de exclusão de grupos em debates sobre imigrantes, mulheres, homossexuais e transgêneros.
Além disso, as mudanças permitem “alegações de doença mental ou anormalidade quando baseadas em gênero ou orientação sexual, dado o discurso político e religioso sobre transgenerismo e homossexualidade”. A medida foi duramente criticada. Em nota conjunta, a Aliança Nacional LGBTI+ e a Associação Brasileira de Famílias Homotransafetivas (ABRAFH) relembraram que, “desde 1990, a Organização Mundial da Saúde não reconhece a homossexualidade como doença” e que as mudanças se tratam de um retrocesso.
“Essa decisão viola os princípios dos direitos humanos, retrocedendo conquistas históricas e reforçando estigmas que colocam vidas em perigo”, reforçou a nota, que solicita que governo adote medidas firmes para proteger os direitos humanos e a segurança da população. Vale destacar que o STF equiparou a homofobia e transfobia ao crime de racismo, inafiançável.
O presidente da Aliança Nacinal LGBTI+ e da ABRAFH, Toni Reis, destacou ao Correio da Manhã que “havendo algum crime que aconteça nas redes sociais”, os advogados das instituições “estão prontos para processar e tomar todas as medidas judiciais cabíveis contra a Meta”.
“Mas se não houve crime, não podemos entrar com as ações, mas estamos preparados”, disse Reis.