A posse do presidente da Venezuela, Nicolás Maduro, para um terceiro mandato consecutivo, realizada na última sexta-feira (10), gerou reações de forte repúdio por parte de autoridades brasileiras. Maduro, que antes da última tentativa de eleição, tinha boas relações com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, desta vez foi criticado sem qualquer reprimenda por diversos integrantes do governo, incluindo o vice-presidente Geraldo Alckmin. Maduro declarou-se eleito presidente sem qualquer demonstração de que esse tenha sido de fato o resultado do pleito. Por isso, o governo Lula não reconheceu sua vitória. Nenhuma autoridade brasileira foi à posse. O Brasil foi representado pela embaixadora em Caracas, Glivânia Maria de Oliveira, para a cerimônia.
O vice-presidente Geraldo Alckmin (PSB) lamentou a situação e reafirmou que o Brasil não reconhece as eleições que deram a vitória a Maduro. Em entrevista à CNN, ele ressaltou a defesa da democracia como um valor civilizatório, “contrário às ditaduras que suprimem a liberdade”.
O ministro de Portos e Aeroportos, Silvio Costa Filho (Republicanos), chamou a posse de Maduro de "um ataque aos princípios democráticos" e destacou que o povo venezuelano merece liberdade e um futuro de paz, que só é possível com o respeito à democracia. O ministro dos Transportes, Renan Filho (MDB), também condenou a posse, afirmando que a tomada do governo pela força deve ser repudiada por todos que defendem a democracia. "O MDB sempre se posicionou a favor das liberdades individuais, da justiça e do voto popular", completou.
Ainda que tais posições não tenham sido externadas por integrantes do PT, o partido de Lula, o fato de terem sido autorizadas sem qualquer observação mostram como está londe de ser a mesma a relação atual do governo com o presidente da Venezuela após sua contestada eleição.
Fora do governo, outras autoridades chegaram a propor medidas mais duras. O presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), defendeu a adoção de medidas políticas e econômicas para repudiar a posse. “A democracia exige eleições limpas, sem fraudes, e respeito ao voto popular. Não aconteceu isso na Venezuela. A posse de Nicolás Maduro afronta a vontade do povo venezuelano e deve ser repudiada com medidas políticas e econômicas, para que ditaduras não se sintam legitimadas”, declarou.
Maduro assumiu o cargo em um contexto de crescente polarização na Venezuela e com questionamentos sobre a transparência das eleições de 2024. No dia 9 de janeiro, partidos da oposição venezuelana protestaram nas ruas contra os resultados, reivindicando a vitória de Edmundo González (Pud), atualmente exilado na Espanha. A ex-deputada Maria Corina Machado, líder da oposição, afirmou ter sido presa durante os protestos, embora as autoridades venezuelanas tenham negado a acusação.
Canal aberto
De qualquer modo, para a advogada Hanna Gomes, especialista em direito internacional, o envio da embaixadora do Brasil a Caracas, apesar da falta de reconhecimento da legitimidade das eleições, reflete que o canal de comunicação ainda está aberto.
“Isso não implica necessariamente que o Brasil esteja rompendo relações com a Venezuela, mas sinaliza um afastamento político em termos de apoio e alinhamento”, iniciou. “Fica evidenciado que mesmo os amigos podem ser repreendidos e que o governo brasileiro não coaduna com ilegalidades”, prosseguiu Hanna.
Cautela
Para o consultor de Política Internacional Vito Villar, a postura cautelosa do Brasil pode ser explicada por considerações pragmáticas, já que há uma grande população venezuelana no Brasil e uma significativa comunidade brasileira na Venezuela.
“Ao manter as relações com o país, o Brasil busca não aumentar a instabilidade na região, aumentando tanto a crise de refugiados quanto a influência da China e Rússia na região. Mas a situação nunca esteve tão deteriorada em um governo de esquerda quanto está no momento, demonstrando o afastamento já comentado”, disse Villar. “Portanto, embora a relação bilateral não tenha chegado ao fim, ela segue em uma posição sensível e sujeita a ajustes com base nos desdobramentos políticos e econômicos em ambos os países”, afirmou.