Livre-comércio no Mercosul pode enfraquecer o bloco
Javier Milei indicou que sairá do grupo se não puder criar aliança com os EUA
Se a política do Mercado Comum do Sul (Mercosul) for alterada para permitir tratados bilaterais, países como o Uruguai e a Argentina, que têm manifestado interesse em acordos com os Estados Unidos da América (EUA) ou com a China, poderão adotar posições mais individualistas. Neste sentido, o Brasil precisará pensar em seus próximos passos, pois essa flexibilidade “certamente enfraquece o país” pela liderança que tem sobre o bloco. A avaliação é da advogada especialista em direito internacional Hanna Gomes.
“A abertura e flexibilidade do bloco certamente enfraquece o Brasil, uma vez que o livre comércio, em região de fronteira, por exemplo, pode ser afetado. Além disso, para o bloco, essa possibilidade de autonomia e independência, em particular no Mercosul, pode revitalizá-lo como plataforma de integração global, mas também corre o risco de desintegrar a coesão interna. Nesse sentido, um alinhamento exclusivo com os EUA pode enfraquecer o país que o fizer, bem como o Sul Global no todo, minando a força geopolítica e econômica da região”, explicou a advogada.
Em novo discurso, o presidente da Argentina, Javier Milei (La Libertad Avanza), defendeu na quinta-feira (23), que “há maneiras” de seu país avançar em um acordo de livre-comércio fora do Mercosul, porém, sem a necessidade de deixar o bloco comercial. À imprensa, durante o Fórum Econômico Mundial, em Davos, na Suíça, ele afirmou que fará "o que é melhor" para a população argentina.
"Nós vamos tentar avançar e fazer o que é melhor para os argentinos. Mas creio que há formas de avançar sem perder a aliança com o Mercosul [...], abrindo a possibilidade de que cada um [dos países-membros] possa abrir seu comércio unilateralmente", disse Milei.
Na data anterior, o presidente argentino indicou que deixaria o bloco caso fosse necessário para concretizar a aliança com os Estados Unidos, ainda que não deseje tomar tal medida. A declaração foi feita em entrevista à Bloomberg. “Se a condição extrema for essa, sim. Mas há mecanismos que podem ser usados mesmo dentro do Mercosul, então acreditamos que isso pode ser feito sem necessariamente ter que sair [do bloco]”, afirmou o líder político.
Mercosul
O bloco econômico, que foi criado em 1991 pelo Tratado de Assunção, reúne cinco membros efetivos, sendo eles, os quatro fundadores – Argentina, Brasil, Paraguai, e Uruguai – e a Venezuela, que foi reincorporada recentemente. Além dos países associados: Bolívia, Chile, Colômbia, Equador, Guiana, Peru, Suriname e Panamá — que participam como convidados.
Entre os objetivos, estão inclusos a promoção de livre circulação de bens, serviços e fatores produtivos entre os países; o estabelecimento de uma tarifa externa comum e a adoção de uma política comercial comum; a coordenação de políticas macroeconômicas e setoriais entre os Estados Partes; e o compromisso de combinar legislações entre si. O grupo, porém, não permite que os parceiros assinem acordos comerciais fora do bloco, pois segundo explicou Hanna Gomes, isso enfraquece o princípio de união e incentivo regional, que é a ideia central desses blocos.
“Se líderes sul-americanos seguirem essa linha de pensamento, há risco de um esvaziamento de blocos como o Mercosul, que visam justamente a proteção e o desenvolvimento regionais”, iniciou a internacionalista.
“Se a ideia prevalecer, o Brasil precisará decidir entre se adaptar a uma nova dinâmica mais fragmentada ou apostar no fortalecimento do bloco, sugerindo parcerias com outras grandes potências”, prosseguiu.