Na véspera da votação das comissões permanentes da Câmara dos Deputados, o então deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL-SP) declarou, nesta terça-feira (18), que não retornará dos Estados Unidos da América (EUA) para o Brasil. Ao anunciar a medida, divulgada através de um vídeo publicado em suas redes sociais, ele licenciou-se de seu cargo como deputado federal. Eduardo Bolsonaro, que já está nos Estados Unidos há 19 dias, afirmou que tomou a decisão para concentrar esforços em supostas negociações de apoio com o governo norte-americano para aplicar medidas para os “violadores dos direitos humanos” – se referindo às prisões dos envolvidos nos atos antidemocráticos de 8 de janeiro.
Outro motivo de seu refúgio diz respeito ao que ele alega ser uma resposta ao cenário de “perseguição política” que a direita brasileira vem supostamente sofrendo do Supremo Tribunal Federal (STF). Em fevereiro, parlamentares do PT encaminharam à Corte um pedido de apreensão do passaporte de Eduardo Bolsonaro. Os parlamentares alegam que o então deputado estaria atentando contra a soberania nacional e tentando obstruir a Justiça ao se articular com parlamentares americanos para que proibissem o ministro Alexandre de Moraes de entrar nos Estados Unidos. O próprio Moraes solicitou um posicionamento da Procuradoria-Geral da República (PGR) sobre o tema.
Com isso, apesar de não ter sido citado no processo que indiciou 33 pessoas por tentativa de golpe de Estado, ele comentou que teme ser preso ao retornar ao Brasil. Eduardo Bolsonaro ainda ressaltou que o ministro Alexandre de Moraes está tentando usar seu mandato como "cabestro, como ferramenta de chantagem e coação do regime de exceção, como instrumento para me prender e impedir que eu represente os melhores interesses para o meu país". Ele não apresentou provas sobre o suposto “regime de exceção” do STF e, também sem provas, disse que o plano de seus adversários é prender seu pai para assassiná-lo na prisão.
Horas depois da notícia de refúgio, no final da tarde desta terça-feira, o procurador-geral da República, Paulo Gonet, se manifestou contra o pedido do PT de reter o passaporte de Eduardo Bolsonaro, sob o argumento de falta de provas. Em seguida, Moraes arquivou o pedido.
Relações Exteriores
O então parlamentar estava sendo cotado para assumir a Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional. Todavia, nos bastidores circulou que o presidente do PL, Valdemar Costa Neto, teria conversado com Eduardo Bolsonaro e vetado sua indicação ao posto porque ela poderia aumentar a tensão com o partido, o que também poderia prejudicar o ex-presidente Jair Bolsonaro. Agora, com o refúgio de Eduardo nos Estados Unidos, o líder da oposição na Câmara, Luciano Zucco (PL-RS) – que se manifestou solidário ao colega de partido – assumirá o cargo.
“Ele [Zucco] irá me ajudar institucionalmente a manter essa ponte com o governo Trump e o bom relacionamento com países democráticos e desenvolvidos. Juntos, nós iremos trabalhar para resgatar liberdades perdidas para o nosso Brasil”, disse Eduardo Bolsonaro.
Estratégia
O Correio da Manhã ouviu analistas sobre qual seria a estratégia de Eduardo Bolsonaro. Para o coordenador de Análise Política da BMJ Consultores Lucas Fernandes, a decisão do filho de Jair Bolsonaro parece ter sido tomada de última hora diante da negativa de Valdemar Costa Neto.
“Talvez o cálculo tenha sido de que, estando nos Estados Unidos, ele conseguiria ter uma projeção maior, por ter uma boa navegação nas redes sociais e conseguir dialogar bastante com o nicho bolsonarista. Isso poderia fazer mais barulho nos Estados Unidos do que dentro da Câmara como mais um deputado sem nenhum cargo especial”. Fernandes ainda ponderou que agora é preciso esperar para ver qual seria a real proximidade de Eduardo Bolsonaro com o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump. “É preciso ver se ele realmente conseguirá ter acesso constante ao primeiro escalão”.
Questionado pelo Correio da Manhã, o mestrando em ciência política pela Universidade de Brasília (UnB) João Felipe Marques disse que a postura do agora ex-parlamentar “combina proteção pessoal com uma estratégia de mobilização política”.
“O refúgio de Eduardo Bolsonaro nos EUA é uma forma de evitar um confronto direto com um sistema judicial que ele acusa de perseguição, ao mesmo tempo em que procura ampliar o debate – e, possivelmente, a intervenção – de atores internacionais para pressionar o governo brasileiro a reverter medidas que, segundo sua visão, atacam a liberdade e a democracia. Essa postura é coerente com a estratégia mais ampla de Bolsonaro e da oposição, que buscam transformar desafios legais em argumentos de perseguição política e mobilizar a base em torno de uma agenda que inclui a defesa de seus supostos direitos e interesses”, explicou Marques.