Por: Gabriela Gallo

Bolsonaro e outros setes se tornam réus por tentativa de golpe

Bolsonaro defendeu-se: acusações "infundadas" | Foto: Lula Marques/Agência Brasil

Como estava previsto, por unanimidade a Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) aceitou, na manhã desta quarta-feira (26), o inquérito da Procuradoria-Geral da República (PGR), tornando o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) e outros sete indiciados réus por tentativa de golpe de Estado. A primeira turma entendeu que a denúncia comprova a materialidade dos crimes e indícios de autoria. Dá-se início, assim, a fase processual penal. A Primeira Turma do STF é composta pelos ministros Cristiano Zanin, Alexandre de Moraes, Cármen Lúcia, Luiz Fux e Flávio Dino.

O processo da PGR denunciou 34 pessoas ao todo, mas dividiu os indiciados em grupos. Os que foram considerados réus na última sessão da primeira turma compõem o “que o procurador-geral da República classificou como o “núcleo crucial”, que elaborou o plano de tentativa de golpe de Estado – além do plano de matar o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), o vice-presidente Geraldo Alckmin (PSB) e o ministro Alexandre de Moraes, na época, presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE).

Além de Bolsonaro, os outros réus do núcleo duro são: o ex-ministro e vice de Bolsonaro na chapa das eleições de 2022, Walter Braga Netto; o ex-ajudante de ordens de Bosonaro tenente-coronel Mauro Cid; o ex-ministro do Gabinete de Segurança Institucional (GSI) general Augusto Heleno; o ex-diretor da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) e hoje deputado federal Alexandre Ramagem (PL-RJ); o ex-ministro da Justiça Anderson Torres; o ex-comandante da Marinha Almir Garnier, e o ex-ministro da Defesa Paulo Sérgio Nogueira.

Todos os réus passarão a responder a uma ação penal pelos seguintes crimes: tentativa de abolição violenta do estado democrático de direito, tentativa de golpe de Estado, envolvimento em organização criminosa armada, dano qualificado e deterioração de patrimônio tombado.

Julgamento

Em seu voto, o ministro Flávio Dino comparou a tentativa de golpe com a instauração do golpe militar em 1964. “Se diz: ‘Mas não morreu ninguém’. No dia 1º de abril de 1964, também não morreu ninguém. Mas centenas de milhares morreram depois. Golpe de Estado mata! Não importa se isso ocorre no dia, no mês seguinte ou alguns anos depois”, defendeu Dino.

Na mesma linha, a ministra Cármen Lúcia reiterou em seu voto que “ditadura mata”.

“Ditadura vive da morte, não apenas da sociedade, da democracia, mas de seres humanos de carne e osso”, reiterou a ministra.

Divergências

Assim como nas primeiras sessões, o único ministro que apresentou divergências em relação aos demais colegas foi o ministro Luiz Fux – ainda que ele tenha acompanhado o voto do relator, ministro Alexandre de Moraes. Apesar de ter concordado em tornar réus os indiciados, o magistrado disse que deverá apresentar divergências em relação ao cálculo das penas. "Confesso que em determinadas situações deparo com uma pena exacerbada", declarou Fux, que recentemente pediu vista (mais tempo) para analisar o caso da cabeleireira Debora Santos, que pichou com batom a estátua da Justiça.

Bolsonaro

Em uma coletiva de imprensa após se tornar réu, Jair Bolsonaro alegou que as acusações contra ele são graves e “infundadas”.

“Parece que tem algo pessoal contra mim. A acusação é muito grave, e infundada. [...] Golpe tem povo, mas tem tropa, tem armas e tem liderança. Um ano, dois anos de investigação, não descobriram quem porventura seria esse líder”, destacou o ex-presidente para jornalistas, acompanhado de aliados. Ele voltou a atacar a credibilidade das urnas eletrônicas.

Bolsonaro ainda completou que não assinou a minuta do golpe e que teria que convocar os conselhos da República e da Defesa para poder dar andamento à ideia. “Não adianta botar um decreto na frente do presidente, de estado de Defesa, e assinar que está resolvido. Não convoquei os conselhos da República e da Defesa. Nem atos preparatórios houve pra isso. Se é que você trabalhar com um dispositivo constitucional é sinal de golpe. Golpe não tem lei, não tem norma”, completou.

Próximos passos

A especialista em advocacia criminal Karolyne Guimarães explicou ao Correio da Manhã que, tornados réus, agora se dará início ao processo com oitivas de testemunhas de acusação e defesa. Além disso, também serão realizadas outras diligências como reconhecimento de pessoas, acareações e interrogatório dos réus. Após a fase do interrogatório, as partes poderão requerer diligências. Finalmente, abre-se o prazo para apresentar memoriais – que são a última etapa das partes envolvidas antes da sentença – começando pela acusação e depois seguindo para as defesas. Após todo esse rito, a ação estará apta para ser julgada.

A especialista em advocacia criminal Karolyne Guimarães explicou que, segundo a Constituição Federal e o Código de Processo Penal, “um réu só deve ser considerado culpado após o trânsito em julgado de sentença penal condenatória”.

“Quem deve provar que o réu cometeu um crime é a acusação. Mas, na prática, um réu denunciado é praticamente um réu condenado, pois a defesa tem que buscar todos os elementos para demonstrar o contrário do que está escrito na denúncia e nas provas colacionadas aos autos”, destacou a criminalista.

Os julgamentos do núcleo 2, que são acusados de organizar ações para “sustentar a permanência ilegítima” de Bolsonaro no poder, em 2022, está agendada para 29 e 30 de abril. O do núcleo 3, do qual os indiciados são acusados de planejarem "ações táticas" para efetivar o plano golpista, está marcado para 8 e 9 de abril. Finalmente, o núcleo 4 da trama, acusado de organizar ações de desinformação para propagar notícias falsas sobre o processo eleitoral, está agendado para 6 e 7 de maio.