As recentes elevações de tarifas anunciadas pelo presidente dos Estados Unidos, Donald Trump (Republicano), ainda geram incertezas sobre os impactos para o Brasil. A aplicação das sobretaxas, que já havia sido antecipada por Trump nas semanas anteriores, foi confirmada na última quarta-feira (2) durante uma coletiva de imprensa na Casa Branca. Para o Brasil, a medida implica uma tarifa adicional de 10% sobre as importações, além dos 25% já aplicados ao aço e ao alumínio. O Correio da Manhã consultou especialistas para entender melhor as consequências dessa decisão.
Na avaliação da professora de Relações Internacionais do Instituto Brasileiro de Mercado de Capitais (Ibmec-SP), Karina Calandrin, as novas tarifas impactam tanto o plano econômico quanto o político e diplomático do país. Segundo Calandrin, essa elevação tende a reduzir a competitividade de exportações brasileiras diretamente afetadas, o que pode resultar em uma queda nas vendas externas e em dificuldades para setores inteiros da economia nacional.
“Além disso, mesmo os produtos não diretamente tarifados podem ser impactados de maneira indireta, na medida em que outros países busquem redirecionar suas exportações para mercados alternativos, aumentando a concorrência com os produtos brasileiros em regiões como Europa, Ásia e América Latina”, explicou.
Reação internacional
Em reação ao tarifaço, a China anunciou uma tarifa de 34% sobre produtos dos EUA, com início em 10 de abril, além de restrições à exportação de minerais raros. A União Europeia, segundo a Reuters, também se prepara para adotar medidas retaliatórias contra a tarifa de 20% de Washington, caso as negociações falhem.
Na semana passada, o Congresso brasileiro aprovou o "PL da Reciprocidade" (PL nº 2.088/2023), que permite ao governo adotar contramedidas tarifárias. A medida, que teve a unanimidade tanto de governistas quanto oposicionistas na Câmara e no Senado, aguarda a sanção do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que estuda também recorrer à Organização Mundial do Comércio (OMC).
Impacto moderado
Para a internacionalista Elisa Ribeiro, embora os EUA sejam o segundo maior parceiro comercial do Brasil, o impacto das tarifas será moderado, já que as exportações para os EUA representam apenas 2% do PIB brasileiro. Ela destacou que, em março, as exportações para os EUA caíram 3,3%, enquanto as importações aumentaram 17,6%, gerando um déficit de US$ 0,26 bilhões na balança comercial. Ribeiro também observou que, no primeiro trimestre de 2025, as exportações para os EUA caíram 0,8% em relação ao ano anterior.
Ela também alertou que os impactos serão sentidos em ambos os países: “Nos EUA, os produtos importados provavelmente terão aumento de preço, o que pode levar a um incremento da inflação. Com o objetivo de conter a alta, o Federal Reserve (Banco Central americano) deverá intervir, elevando as taxas de juros, o que acarretará desaceleração do consumo e do investimento interno”.
Oportunidades
Na perspectiva do gerente de Comércio Internacional da BMJ Consultores, Leandro Barcelos, a situação pode, inclusive, abrir oportunidades para o Brasil se posicionar como alternativa para importadores que buscam evitar tarifas mais altas sobre produtos de outros países.
“Setores com vantagens competitivas podem se beneficiar, e a guerra comercial global pode levar a uma reconfiguração do comércio internacional. Além disso, a imposição de tarifas de 10% a parceiros comerciais na América Latina, que tinham tarifa zero para exportação para os Estados Unidos, criam oportunidades para o Brasil, pois colocam a indústria brasileira no mesmo grau de competitividade”, afirmou Barcelos.
Situação negativa
Por outro lado, o economista e doutor em Relações Internacionais Igor Lucena alerta para os riscos da medida. Embora haja possíveis efeitos positivos, ele acredita que, na prática, a situação é prejudicial para o Brasil. Lucena explica que, com o aumento das tarifas, produtos americanos importados, como serviços, softwares, peças de computador, celulares e aeronaves, ficarão mais caros, já que serão produzidos a custos mais altos nos Estados Unidos devido às tarifas aplicadas por outros países. Isso resultará na importação da inflação, que será repassada ao consumidor final.
“De uma maneira geral, tarifas sempre levam a menos comércio, é uma situação pior. Então, por mais que o Brasil esteja em uma posição melhor [que outros países], já que as nossas tarifas foram aplicadas apenas em 10%, eu ainda acho que isso é muito negativo”, explicou.