O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF), Gilmar Mendes, determinou nesta segunda-feira (14) a suspensão de todos os processos em curso na justiça brasileira que tratam da chamada “pejotização” — prática que consiste na contratação de trabalhadores como pessoas jurídicas ou autônomos para a prestação de serviços. A medida foi tomada após o STF reconhecer, no sábado (12), a repercussão geral do Tema 1389, que trata da legalidade e dos limites dessa forma de contratação.
Com a repercussão geral, a Corte estabelece um entendimento unificado sobre o tema, que servirá de orientação para decisões futuras em instâncias inferiores, evitando que o Supremo precise julgar múltiplos casos idênticos. Contratos dessa natureza são comuns em diversos setores da economia, como representação comercial, corretagem de imóveis, advocacia associada, saúde, artes, tecnologia da informação, e serviços de entrega, entre outros.
Controvérsia
Na decisão, Gilmar Mendes — que é o relator — destacou que a controvérsia em torno da pejotização tem provocado uma avalanche de processos no STF, especialmente por meio de reclamações constitucionais. Segundo o ministro, a falta de uniformidade nas decisões da Justiça do Trabalho tem gerado instabilidade jurídica e ampliado a insegurança entre empregadores e trabalhadores.
“O descumprimento sistemático da orientação do Supremo Tribunal Federal pela Justiça do Trabalho tem contribuído para um cenário de grande insegurança jurídica, resultando na multiplicação de demandas que chegam ao STF, transformando-o, na prática, em instância revisora de decisões trabalhistas”, afirmou o magistrado.
No caso em análise, são discutidos três pontos centrais: se a Justiça do Trabalho tem competência para julgar ações que tratam de possível fraude em contratos civis de prestação de serviços; além da legalidade da contratação de trabalhadores como autônomos ou pessoas jurídicas, considerando o entendimento já firmado pelo Supremo no julgamento da terceirização de atividades-fim, que reconheceu a validade constitucional de diferentes formas de organização produtiva. Também está em debate a responsabilidade pelo ônus da prova em casos de alegada fraude, ou seja, se cabe ao trabalhador comprovar a existência de vínculo empregatício disfarçado ou se essa obrigação recai sobre a empresa contratante
O caso concreto que originou a análise envolve a tentativa de reconhecimento de vínculo empregatício entre um corretor de seguros e uma seguradora, que mantinham entre si um contrato de franquia.
E agora?
O Correio da Manhã conversou com advogados da área trabalhista para entender melhor os efeitos dessa decisão. Ainda não há data definida para o julgamento do tema pelo plenário do STF, e, segundo o coordenador da área de Direito Trabalhista do EFCAN Advogados, Felipe Mazza, com a suspensão dos processos, as demandas relacionadas ao tema ficarão sem movimentação até a decisão final. Para ele, a tendência, inclusive, é “que o entendimento do STF prevaleça, podendo levar à extinção ou improcedência desse tipo de demanda, a depender do estágio do processo”.
A advogada Stephanie Christine de Almeida, do Poliszezuk Advogados, observa que a suspensão das ações em andamento retarda uma decisão já tomada pela Justiça do Trabalho. “São ações que muitas vezes já são longas e agora, poderão demorar ainda mais para terem um desfecho”, explicou. “Para os trabalhadores que possuem processos com esse assunto, o principal impacto é a incerteza jurídica criada pela suspensão, uma vez que não sabemos qual será o entendimento que o STF consolidará”, prosseguiu Almeida.
Por sua vez, o advogado Henrique Soares Melo, do escritório NHM Advogados, aponta que o afastamento da existência de vínculo de emprego em qualquer hipótese, quando firmado contrato de prestação de serviços juridicamente válido e sem vícios, embora desfavorável aos trabalhadores, traz mais segurança jurídica a eles. “Para evitar litígios onde os trabalhadores correm, em alguns casos, risco de não obter os benefícios da justiça gratuita e, ainda, serem condenados em custas e honorários de sucumbência em caso de derrota do processo”, explicou o especialista.