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'Um manda, o outro obedece', diz Pazuello ao receber Bolsonaro após crise da vacina

| Foto: Foto: reprodução

Um dia após falar em "traição" e desautorizar o ministro da Saúde publicamente, o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) fez uma visita ao general Eduardo Pazuello para acabar com rumores de que o auxiliar seria demitido.

A visita, fora da agenda oficial dos dois, foi transmitida por uma rede social de Bolsonaro, que foi ao Hotel de Trânsito de Oficiais do Exército, onde Pazuello recupera-se da covid-19.

Apesar do diagnóstico confirmado, os dois sentaram-se próximos e não usaram máscara de proteção. Bolsonaro já contraiu a doença. Na transmissão, ambos negaram atrito.

"Semana que vem talvez, com toda certeza, tu volta para o batente", disse Bolsonaro.

"Pois é, estão dizendo que não, né? Estamos juntos", reagiu Pazuello.

"Falaram até que a gente estava brigado aqui. No meio militar, é comum acontecer isso daqui, algum choque, alguma coisa. Não teve problema nenhum", prosseguiu Bolsonaro.

"Senhores, é simples assim. Um manda e o outro obedece, mas a gente tem um carinho", disse Pazuello.

"Opa, está pintando um clima aqui", disse Bolsonaro em tom de brincadeira.

Na manhã de quarta-feira (21), Bolsonaro desautorizou Pazuello, que, no dia anterior, havia anunciado um acordo com o estado de São Paulo para a compra de 46 milhões de doses da CoronaVac, vacina da farmacêutica chinesa Sinovac que será produzida no Brasil pelo Instituto Butantan.

A um internauta que acusou Pazuello de traí-lo com o acordo de compra da vacina e disse que Bolsonaro havia se enganado mais uma vez com alguém de sua equipe, o presidente falou em traição.

"Qualquer coisa publicada, sem comprovação, vira TRAIÇÃO", reagiu Bolsonaro na internet.

O presidente foi informado ainda no final de semana da intenção da compra, pelo Ministério da Saúde, de 46 milhões de doses da vacina CoronaVac.

Segundo assessores do Palácio do Planalto e do Ministério da Saúde, Bolsonaro não se opôs à iniciativa inicialmente, mas mudou de posição no final da tarde da terça-feira (20), após repercussão negativa de seus apoiadores nas redes sociais.

Desde o anúncio feito por Pazuello, em reunião virtual com governadores, eleitores bolsonaristas iniciaram campanha nas redes contra o que chamam de "vacina chinesa".

As críticas chegaram ao perfil oficial do presidente, que decidiu adotar um recuo estratégico. Na própria terça, segundo relato feito à reportagem, ele telefonou a Pazuello para informar que se posicionaria contra o anúncio.

Na manhã de quarta, antes de o presidente se manifestar nas redes sociais, Pazuello chegou a entrar em contato com representante do governo paulista. Segundo um auxiliar da gestão estadual, ele informou que a compra de doses seria menor do que a anunciada no dia anterior.

A tentativa do ministro de diminuir a tensão, no entanto, não deu certo. Após as críticas do presidente, Bolsonaro e Pazuello se falaram por telefone para ajustar a mudança de discurso e combinar a divulgação de uma nota pública, na qual alegariam que houve "interpretação equivocada".

Como lembraram auxiliares palacianos, Pazuello costuma informar todas as iniciativas de sua pasta a Bolsonaro e não faz nada sem o conhecimento do chefe do Executivo, o que não foi diferente neste episódio.

Em conversas reservadas na manhã de quarta, o presidente elogiou a rápida reação de Pazuello e disse que ele não é como o ex-ministro Luiz Henrique Mandetta, que resistia em obedecer e seguir as suas orientações.

Além da reação negativa nas redes sociais, o recuo do presidente, segundo assessores, deveu-se à comemoração do governador de São Paulo, João Doria (PSDB).

Após o anúncio de Pazuello na terça-feira, Doria disse que "venceu o Brasil".

O tucano é pré-candidato à sucessão presidencial em 2022, quando Bolsonaro pretende disputar a reeleição. Em mensagem a ministros, relatada à reportagem, o presidente ordenou que, a partir de agora, sua equipe não trate sobre iniciativas de imunização com o governador paulista.

A pandemia de covid já deixou mais de 155 mil mortos no Brasil, e, após sete meses de quarentena, 3 em cada 4 brasileiros afirmam que querem se vacinar assim que possível, segundo pesquisa Datafolha dos dias 5 e 6 de outubro.

Na quarta-feira, Bolsonaro disse que havia mandado cancelar o protocolo de intenções assinado entre a Saúde e o governo de São Paulo.

"Já mandei cancelar. O presidente sou eu, não abro mão da minha autoridade", disse em um evento em Iperó (SP).