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HQs que desafiam impérios

Por Rodrigo Fonseca

Especial para o Correio da Manhã

Com a recente estreia da aventura "The Flash", bancas de jornais de todo o país recebem uma série de pedidos pelas peripécias do velocista escarlate, assim o sucesso de "Aranhaverso" faz o público leitor caçar gibis de Miles Morales com avidez. Mas existem títulos que fogem do eixo Marvel e DC em evidência, nas gibiterias, nas livrarias e mesmo nas mãos de jornaleiros de tarimba. Confira algumas dessas HQs que vitaminam qualquer coleção.

SESSENTA PRIMAVERAS NO INVERNO, de Aimée de Jongh e Ingrid Chabbert: Cabem à editora Nemo todos os louros da inclusão e da excelência por trazer ao Brasil a HQ do ano. Encarada hoje como a quadrinista mais inquietante de nosso tempo, a autora holandesa responsável por cults como "Táxi!" une seu talento ao da roteirista francesa Ingrid Chabbert para falar de amor numa fase outonal da vida. No dia em que completa 60 anos, Josy, a protagonista desta joia, recusa-se a assoprar as velas do bolo de aniversário. Ela já está de malas prontas. Havia tomado uma decisão: iria deixar o marido e a casa para recuperar a sua liberdade, ganhando a estrada com a velha Kombi. No caminho, uma paixão inesperada, em todos os sentidos, vai mudar suas perspectivas acerca do futuro.

A NOITE DO CORVO, de Marco Galli: É uma experiência lisérgica acompanhar a transformação do traço de um dos mais respeitados desenhistas das HQs italianas cuja arte mudou depois que ele perdeu o controle de seus polegares, em decorrência de sequelas de uma doença. A aposta numa narrativa mais rústica é fundamental para ele narrar a saga de um pistoleiro psicótico que usa uma máscara de pássaro em seus assassinatos. A bela versão nacional do gibi, num álbum gráfico que valoriza o colorizado estilizado do autor, é da Faria e Silva Editora.

O BAILE DE MÁSCARAS DO MIASMAOTEIRO, de Mizuki Mizushiro e Yoshiki Tanaka: É sempre essencial se falar de mangás quando o assunto é cartografar o mundo quadrinístico fora da hegemonia americana. E nessa discussão, esta minissérie se impõe por sua excelência gráfica, que a edição da Mythos preservou. Num Japão devastado, numa era em que o mundo foi corroído por um gás altamente venenoso chamado miasma, humanos mascarados caçam e matam seres que foram transformados em monstros pelos efeitos desse vapor.

VLAD DRÁCULA, 1897Esteban Maroto e Roy Thomas: Eis uma aula de desmistificação. Dois dos maiores nomes dos quadrinhos mundiais se juntam para contar a história real de uma das mais fascinantes personalidades da Idade Média, o controverso Vlad, o Empalador. Sua trama desvenda o homem por trás do mito, e a fusão desses eventos reais com o surgimento do vampiro Drácula, imaginado pelo escritor Bram Stoker, em 1897.

SATÃ, AMIGO DAS CRIANÇAS BOAS, de Allan Sieber e Rafael Sica: Tem Brasil nessa lista de leituras imperdíveis, representado pelo cineasta que fechou a década de 1990 com a genial animação "Deus É Pai", em parceria com a estética de Sica. Neste manual sobre o lado bom do Mal, Satã ajuda criança boazinha, que come toda a sua comidinha. É um diabo correto, bondoso e gentil, que, na lírica lúdica de Sieber, adora os pequenos de todo o Brasil.

O MURO, de Antoine Charreyron e Mario Alberti: Um bamba francês do roteiro e um mestre italiano do desenho unem seus talentos neste álbum da Alta Geek. Sua trama nos leva à Europa, mas numa data indeterminada, quando o Mediterrâneo está completamente seco. O Velho Mundo se resume a ruínas e desolação. A civilização não existe mais, e a humanidade vive de saques e consertos, organizando-se em aldeias improvisadas ou caravanas de destroços onde reina a brutalidade. Nesse inferno, Solal, um jovem e habilidoso mecânico, faz de tudo para proteger sua irmã Eva, que sofre de uma grave doença respiratória. Mas quando o suprimento de remédios acaba, eles têm apenas uma esperança: chegar ao "Muro", uma gigantesca comunidade inexpugnável guardada por robôs monstruosos. Lá, vivem quem é encarado como poderoso. Mas a trilha até lá é árdua.

BENDITA CURA, de Mário César: A Nova Conrad marca um golaço em prol da luta contra a homofobia ao laçar este álbum gráfico. Seu protagonista, Acácio do Nascimento teve uma infância dura, pois, quando garoto, preferia brincar de boneca a jogar futebol. O bambolê lhe interessava mais que carrinhos e pistolas de caubói. Assustados com a possibilidade de seu filho ser homossexual, seus pais o submetem a diversos "tratamentos" para que se torne um menino normal como os demais. A dor dele nesses esforços de conversão rende um estudo sobre a resiliência queer.

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