Por: Rodrigo Fonseca | Especial para o Correio da Manhã

O Céu por testemunha

Indicado à Concha de Ouro, 'Conclave' põe Ralph Fiennes em destaque na Oscar Season, a temporada de premiações que antecede o Oscar | Foto: Divulgação

Com 50 prêmios no currículo, entre eles o Globo de Ouro de Melhor Roteiro, "Conclave" é um dos títulos esperados do anúncio dos concorrentes ao Oscar 2025, a ser feito no próximo dia 23. Seu lançamento aqui será na mesma data.Seja pela ambientação vinculada a signos do cristianismo, seja por seu clima de mistério, o thriller - que fechou o menu de estreias do Festival do Rio de 2024, em outubro - evoca "O Nome da Rosa" (1986).

O cult de Jean-Jacques Annaud, baseado em Umberto Eco (1932-2016), não fez parte do rol de referências explícitas usadas pelo diretor austro-suíço Edward Berger na concepção de sua narrativa sobre bastidores da sucessão papal. Seu enredo se ambienta num Vaticano acossado por ameaças terroristas.

É difícil, apesar disso, não lembrarmos de um Sean Connery (1930-2020) de batina, investigando crimes no seio da Igreja. Essa evocação histórica é despertada por Berger com a batalha moral empreendida por um cardeal ungido pelo óleo da retidão (Ralph Fiennes, devastador) a fim de escolher o novo sumo pontífice em meio a um embate de egos. 

 

Edward Berger: 'Me pautei pelo cinema político americano dos anos 1970'

Edward Berger orienta o astro Ralph Fiennes no set de filmagens de 'Conclave' | Foto: Diamond Films/Divulgação

O contexto eleitoral de uma scolha papal que poderia, no máximo, render um drama sobre disputas de vaidades vira um eletrizante suspense sobre jogos de poder, delineado com adrenalina pelas mãos do realizador de "Nada De Novo No Front", título ganhador do Oscar de Melhor Filme Internacional de 2023 (hoje na Netflix).

"Eu me pautei pelo cinema político americano dos anos 1970, principalmente na obra de Alan J. Pakula (diretor de "Todos os Homens do Presidente"), cuja linguagem jamais seguia uma gramática de plano x contraplano e, sim, apostava em longas tomadas de câmera que só mudavam o foco quando a premissa pedia", disse Berger ao Correio da Manhã no Festival de San Sebastián, na Espanha, onde seu suspense ecumênico disputou a Concha de Ouro.

Com base em romance homônimo de Robert Harris, "Conclave" expõe o avanço de uma direita xenófoba, sexista e homofóbica rondando a passagem de bastão no seio eclesiástico dos arredores de Roma, após a morte do Papa. Uma escolha errada para ocupar o lugar de Sua Santidade pode resultar num retrocesso capaz de dar fim a todos os avanços que a religião católica esboçou (ou tentou esboçar) na luta para expiar seus pecados. Em meio à troca de estadista, uma estratégia digna de uma partida de "War" (famoso jogo de tabuleiro) se estabelece conforme o sacerdote Thomas Lawrence (papel de Fiennes) assume a tarefa de conduzir os votos de seus colegas. Tem muito sacerdote querendo essa vaga, como a raposa velha Tremblay (John Lithgow), o moderado Bellini (Stanley Tucci, sempre afiado), o ascendente Adeyemi (Lucian Msamati) e o mais perigoso de todos, o fascista Tedesco (Sergio Castellitto, em avassaladora atuação). Em meio a eles, uma freira (Isabella Rossellini, na mais sólida interpretação de sua carreira) parece saber segredos que podem alterar o destino do Vaticano. Ao avaliar o perigo que o espreita, Thomas diz: "Certeza é o inimigo da unidade. Certeza é o inimigo da tolerância".

"Fiennes é um ator que, na quietude, permite que a gente mergulhe em sua alma", disse Berger ao Correio. "Queria que o filme fosse ancorado nos dilemas do personagem dele e lavasse o público a sentir o embrulho em seu estômago".

"Conclave" foi rodado ao custo de US$ 20 milhões e já arrecadou cerca de US$ 70 milhões. Na versão brasileira, Marcio Simões dubla Fiennes.