Por: LUÍS PIMENTEL JORNALISTA E ESCRITOR

Música, teu nome é mulher

1.Encontrei a Dina, a Nega Luzia e a Maria Fulô confraternizando num boteco do Estácio, subida da Maia de Lacerda. Uma descia o Morro do Pinto e queria saber notícia de um tal de Zé Quieto, que segundo ela de quieto não tinha nada. A outra engolia a última canjebrina e se preparava para subir o Morro do Estácio, com o Nero no corpo, para tocar fogo no barraco onde um certo Wilson Batista, também conhecido como Mulato Calado, estaria acoitado com uma concubina de nome Dolores Sierra - catalã de araque que à noite reinava numa casa de shows da Gomes Freire.

Maria Fulô, uma flor de Maria, escapara dos versos do doutor Humberto Teixeira e tentava acalmar as duas, garantindo que sossegassem o facho porque homem é tudo igual. Pediu-me que pagasse mais um conhaque e contou, mais uma vez, a história de seu bonito nome: vem do fato de que, lá na roça, ela pendurava um candeeiro com querosene no gancho da porta para orientar os viajantes notívagos que passavam pela estrada "íngreme e traiçoeira" (invenção do escritor Armando Pacheco) próxima à sua casa, cantando a "Ave-Maria" ao anoitecer. Mas isso foi antes de se apaixonar pela sanfona de Sivuca e trocar o sertão do Cariri pelos segredos do São Carlos.

2.Eu disse a Doralice que, ao contrário do que diz o samba, o amor não é tolice, bobagem, ilusão; que tudo vale a pena se a alma não é pequena, e ela perguntou se eu tinha algo de meu a dizer além das citações baratas.

3.Encontrei a Tereza na praia de Copacabana e disse que ela não era de ninguém, nem do Tom nem do Billy nem do Lúcio, mas que seria minha nem que para isso eu tivesse que remover montanhas.

Tereza olhou distraída para aquelas pedras que parecem mergulhadas no mar do Leme e perguntou:

"Você é bobo assim mesmo ou só aos domingos?"

4.

Carolina tinha os olhos fundos e um ar de quem está sempre com dor de barriga ou cólicas ou azia. Fomos num sábado a Paquetá tomar umas com os amigos da ilha. Logo ela começou a misturar aquelas cachaças mineiras do Flávio Aniceto com cerveja e a chamar a irmã do Chico Buarque de "cunhadinha".

Na despedida, Cristina me pediu:

"Traz mais não. Essa é chata pra cacete."

5.

Da mesa onde saboreava o peixe frito bem regado, em companhia de Celio Albuquerque e Moacyr Luz, na André Cavalcanti, vi Madalena com os cotovelos no balcão (gesto nada feminino, mas que nela parecia sublime). Cantarolei "Madalena, o meu peito percebeu..." e ela torceu o nariz. Tentei "Madalena, você é meu bem querer..." Ela perguntou seu eu já ouvira falar em Bob Dylan e saiu mastigando a versão do Fausto Nilo, com aquele sotaque do Fagner.

6.

Encontrei a comadre Sebastiana na Casa da Mãe Joana e ela me convidou para comer uma buchada na Feira de São Cristóvão. Disse que não dançava mais xaxado nem aqui nem na Paraíba (probleminha nos ossos) e perguntou se eu já tinha aprendido a "pegar mulher" ou se continuava "o desajeitado de sempre".

Elas sempre sabem magoar.

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