Por: Fernando Molica

Livros, camisetas e Natal

Livros como presente, para incetivar a leitura. | Foto: Adobe Stock

Pesquisa encomendada pela Câmara Brasileira do Livro ao Nielsen BookData aponta o fator preço como decisivo para nosso mercado do livro ser tão restrito. Mas é preciso uma análise mais detalhada para entender as razões que levaram 84% dos entrevistados a, ao longo dos 12 meses anteriores, não comprarem um livro sequer.

No universo de não leitores, 35% citaram o preço para justificar a decisão de passar longe das livrarias (28% apontaram a ausência de lojas especializadas nas proximidades; 26%, a falta de tempo para leitura).

Num país tão pobre e desigual como o nosso, é bem razoável que livros sejam considerados caros. Mas a pesquisa mostra que a percepção negativa do preço é muito parecida em todas as classes sociais (33%, 38%, 37% e 31% para, respectivamente, integrantes das classes A, B, C e D/E). Livro é tido como caro mesmo entre os mais abastados.

Segundo a Nielsen BookData, o preço médio do livro em 2022 foi de R$ 43,00. No fim de semana, o ingresso de cinema no Kinoplex Shopping Leblon comprado pela internet custava entre R$ 68,39 e 84,35 (valores cheios). O combo da pipoca estava entre R$ 40,00 e 80,00 (mais taxas). No UCI Park de Campo Grande, a inteira ficava por R$ 41,04.

Quem quiser ir ao Circo Voador no próximo sábado para ver Vanessa da Mata vai pagar R$ 80,00 pela meia, que, na prática, vale para todos. Um dia de Rock in Rio custa R$ 755,00 (R$ 377 a meia).  

Os não leitores disseram que, nos 12 meses anteriores, tinham comprado roupas (52% deles), celulares (28%), brinquedos (16%) e vinhos (11%). Nota pessoal: durante a Flip, comprei uma camiseta básica na loja da Hering que custou R$ 69,90, preço de boa parte de livros lançados neste ano (a maioria custa menos). Entre os que têm uma renda razoável, o pouco investimento em livros está mais relacionado à falta de hábito de leitura e aos nossos baixos índices educacionais do que com ausência de grana.

Cada um sabe de seu bolso e tem o direito de consumir o que quiser. Mas é uma pena que apenas 16% dos brasileiros comprem livros, que não vejam na leitura algo importante e, acima de tudo, prazeroso.

Em texto publicado na revista "Palavra", do Sesc, o escritor português José Saramago (1922-2010) supõe um diálogo entre ele e um mergulhador que não gosta de ler. Num primeiro momento, Saramago diria ao rapaz que ele não se dava conta do que perdia.

Depois, o escritor imagina a resposta do gajo: "E o senhor, não se dá conta daquilo que está a perder por não mergulhar?". O vencedor do Prêmio Nobel conclui que não vale a pena inventar desculpas para não ler, já que leitura não é obrigação, mas "uma devoção, é uma paixão, é um amor". É decisivo, portanto, despertar esses sentimentos. 

Vale a pena mergulhar, no mar e nos livros, em tudo que faça nossa vida ficar melhor. E não custa sugerir: dar um livro no Natal é bem mais legal do que presentear alguém com uma camiseta.

 

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