Por: Fernando Molica

'Mim não revelei meu voto'

O senador Sérgio Moro declarou antecipadamente o seu voto a favor de Flávio Dino, durante a sabatina na CCJ do Senado? | Foto: Lula Marques/ Agência Brasil

Desde o tempo em que era juiz federal, o hoje senador Sérgio Moro (União-PR) comete erros quando atua como político. Mais uma vez, foi exposto pela divulgação de uma troca de mensagens particular.

Uma foto feita pelo repórter fotográfico Wilton Junior, do jornal O Estado de S.Paulo, revelou conversa por escrito, num aplicativo, em que Moro indica sua decisão de votar a favor da ida de Flávio Dino para o Supremo Tribunal Federal.

Jair Bolsonaro, então, usou redes sociais para detonar aquele que já foi seu aliado, adversário, aliado de novo e, agora, inimigo. Para usar metáfora cara ao ex-presidente, parece aquele casal que alterna beijos e xingamentos, separações e reconciliações. Ora troca beijos; ora xingamentos.

O mandato de Bolsonaro foi marcado por rompimentos barulhentos como letras de boleros, os demitidos eram xingados de traidores, comunistas. A primeira briga com Moro ocorreu quando este deixou o ministério e apontou uma suposta interferência do chefe em indicações para a Polícia Federal.

As trapalhadas de Moro na política começaram na Lava Jato quando atuou de maneira parcial para condenar Lula. As mensagens publicadas pelo Intercept Brasil deixaram claros seus objetivos políticos, como seria reconhecido pelo Supremo Tribunal Federal. No processo, ele deixou de lado a neutralidade que deve caracterizar os magistrados para fazer tabelinha com o Ministério Público Federal. Jogaram tão bem que conseguiram tirar Lula da eleição de Jair Bolsonaro, que entrou em campo com seu principal adversário mandado para o chuveiro.

As urnas mal haviam esfriado quando o mesmo Moro abriu mão da carreira de juiz para assumir seu viés político — topou ser ministro da Justiça de Bolsonaro. Ao optar por integrar governo de um extremista de direita, o ex-juiz deixou evidente sua preferência ideológica e acabou com qualquer dúvida sobre sua atuação política na Lava Jato.

Depois da briga com Bolsonaro, Moro teve uma breve e conturbada experiência na iniciativa privada, tentou ser candidato a presidente e, em outro gesto desastrado, saiu do partido que o abrigara, o Podemos. Deixou para a legenda uma dívida de R$ 2,6 milhões: o acordo para o pagamento do débito pelo partido reforça os argumentos dos que querem cassar seu mandato de senador. Alegam que, como pré-candidato, ele fez campanha ilegal, antecipada e aumentou a exposição de seu nome.

No meio da campanha, arriscado a ficar sem o voto da direita, Moro tomou outro gesto radical e voltou para o ninho político de Bolsonaro, chegou a assessorá-lo num debate contra Lula. Inexperiente no jogo do poder, incapaz de conseguir protagonismo como senador, enrolado numa investigação que poderá tomar seu mandato, meio isolado da tropa de choque bolsonarista, Moro deu outra guinada.

Talvez de olho em uma boa vontade da Justiça quando seu caso chegar aos tribunais superiores, abraçou Dino publicamente, travou com ele um diálogo cordial. Depois, trocou mensagens com um provável assessor, o tal do "Mestrão", em que admitiu que seu voto, sigiloso, seria favorável a um dos principais alvos da ira bolsonarista.

Moro se manifestou, disse que não foi bem assim. Pode ser, ainda que o conteúdo do diálogo seja bem explícito. Odiado pela esquerda, ele agora enfrenta novos ataques da direita, vai ser duro conseguir algum apoio. Para citar um jeito de falar do próprio ex-juiz, é muito improvável que bolsonaristas acreditem em algo como "Mim não revelei meu voto".

 

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