Por: Fernando Molica

O lado errado

Ato Democracia Inabalada | Foto: Lula Marques/Agência Brasil

Políticos que não foram às solenidades que marcaram o aniversário do 8 de Janeiro deixaram evidente que escolheram um lado, o dos que atentaram não contra o governo petista, mas contra a democracia. 

Não vale a desculpa de que a cerimônia no Congresso Nacional tinha caráter político. Não poderia deixar de ser político um evento que lembrava a contestação violenta do resultado eleitoral e que buscava um golpe de Estado.

O que houve anteontem não foram apropriações oportunistas, partidárias ou eleitorais de uma data nacional ou de uma comemoração de conquista esportiva. Foram cerimônias para marcar o mais grave episódio ocorrido desde a redemocratização do país, fruto de um longo processo de maturação e construção das condições para a implantação de uma ditadura. A intentona de 8 de Janeiro foi política; só poderia ser lembrada com um ato político, no melhor sentido da palavra.

Os ausentes foram movidos, principalmente, por motivos, estes sim, partidários e eleitorais. Dispostos a manter e herdar os votos da extrema direita encarnada pelo ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), trataram de ficar longe, não queriam ser alvo das milícias digitais. 

Repetiram assim o erro cometido por setores mais radicais de esquerda que, em 2013 e 2014, perdidos em meio às grandes manifestações, minimizaram depredações como as promovidas pelos chamados black blocs. Procuraram negar o óbvio: as primeiras agressões partiram de policiais, mas, depois, a iniciativa  da violência passou a ser compartilhada com grupos de manifestantes. Na época, chegou a ser utilizada a mesma desculpa que seria reciclada por bolsonaristas em 2023: a culpa era de supostos provocadores infiltrados.

Esses setores da esquerda não perceberam que, naquele processo de negação da política, chocava-se um dos ovos em que nasceria uma extrema direita que acabaria sendo responsável por um processo de contestação violenta, fanatizada e carregada de viés religioso que provocaria o 8 de Janeiro.

Os que, agora, de olho num futuro poder, minimizam ou negam os objetivos políticos da intentona demonstram esquecer que, depois de implantadas, ditaduras, de direita ou de esquerda, também devoram aliados. É só ver o que aconteceu com Juscelino Kubitschek e Carlos Lacerda, que acabariam eliminados da vida política pelo golpe que ajudaram a implantar. Ditaduras gostam de eliminar empregos de governadores, prefeitos, senadores e deputados.

O que houve na segunda-feira revelou quem aceita ou não transigir com a defesa da democracia e da Constituição, e isso não tem a ver com ser de direita ou esquerda. Todos têm o direito de questionar as penas aplicadas e o rito adotado pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento dos acusados de tentativa de golpe. Podem protestar contra a morte de um detento que poderia estar em prisão domiciliar, mas não de negar a gravidade do 8 de Janeiro.

Na nota em que priorizam as críticas ao STF e ao governo e condenam muito rapidamente os ataques de 2023, 30 senadores demonstram esquecer que entre os acusados e condenados há aqueles que evacuaram e urinaram em seu local de trabalho, no nosso Senado. Estão os que destruíram obras de arte que ajudam a contar nossa história, que martelaram uma democracia que, imperfeita, é a que conseguimos construir. 

 

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