O freio de arrumação dado pelo ministro Flávio Dino nas emendas parlamentares, operações da Polícia Federal e o fim do reinado de Arthur Lira (PP-AL) na Câmara deram a Lula (PT) a segurança para tentar diminuir a balbúrdia do Legislativo em seu governo.
Na saideira de 2024, o presidente vetou, na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de 2025, um aumento na forma de reajuste do Fundo Partidário e a garantia de preservação do pagamento de emendas individuais em qualquer situação.
As decisões do presidente e a recomendação da Advocacia-Geral da União de não pagamento das emendas vetadas por Dino reforçam a impressão de uma tabelinha entre o Palácio do Planalto e o ministro do Supremo Tribunal Federal e aumentam o risco de uma retaliação do Legislativo a partir de fevereiro.
Mas Lula decidiu pagar para ver, mesmo diante da possibilidade de o Congresso derrubar seus vetos — na avaliação do governo, o fato representará um desgaste a mais para o Legislativo. O Planalto sabe que, apesar da polarização nacional, eleitores da esquerda e da direita não gostam dessa história de dar ainda mais dinheiro para partidos políticos nem da permissão para parlamentares distribuirem verbas como aqueles aviõezinhos que Silvio Santos lançava para a plateia. Precisava, também, dar uma demonstração de força.
Há também a expectativa de que, com Hugo Motta (Republicanos-PB) no comando da Câmara, a relação com a Casa não tenha o aspecto faca no pescoço praticado por Lira. O provável futuro presidente tem perfil mais amistoso e, apesar de jovem — 35 anos — é experiente (exerce mandatos de deputado federal desde 2011) e construiu uma boa relação com colegas de diferentes partidos.
A capacidade de diálogo de Motta foi um dos fatores decisivos para que fosse indicado para a sucessão de Lira e desemperrasse o jogo na disputa entre Elmar Nascimento (União-BA) e Antonio Brito (PSD-BA). O primeiro é tido como ríspido; o segundo, de ser ligado demais ao Planalto. O governo sabe que Motta não poderá agir contra os interesses corporativos de seus colegas, mas espera que a relação seja menos conflituosa.
Já no Senado, a situação será inversa. O moderado e conciliador Rodrigo Pacheco (PSD-MG) — excessivamente mineiro até para os padrões políticos de seu estado — dará lugar a Davi Alcolumbre (União-AP), que encarna o papel de presidente de um imaginário sindicato de senadores. Ele, porém, não costuma exercitar o estilo trator de Lira. A transição nas duas Casas é também uma chance para ocupação de espaços pelo governo.
Avalia também que a entrega de ministérios ao Centrão servirá para acalmar o Legislativo. A consolidação e ampliação da base de apoio no Congresso no início de 2025 é vista como fundamental para viabilizar a formação de uma frente de partidos que apoiem a chapa que deverá ser encabeçada por Lula em 2026.
A teimosia do inelegível Jair Bolsonaro em se lançar à Presidência é encarada como um trunfo pelos petistas, que colabora para desarticular a direita e inibe o lançamento de outras candidaturas.
Pouca gente do campo conservador quer uma briga aberta com o ex-presidente, sempre disposto a falar em traição e a arremessar petardos verbais na direção de aliados.
Lira tentou ao máximo quebrar a resistência de Dino, mas, na prática, reconheceu que não havia mais o que fazer. O Planalto, agora, conta com o recesso do Congresso para esfriar os ânimos e torce para que a PF avance um pouco mais nas investigações sobre malfeitos na aplicação das emendas, o que reforçaria a ideia de que muitas delas são pretexto para a aplicação irregular de verbas públicas.
O governo tenta aproveitar o recuo forçado do Congresso e procura mostrar que está vivo.