Por: Fernando Molica

Projeto de guarda armada amarra tropa ao prefeito

Prefeito Eduardo Paes | Foto: Reprodução/Internet

Ao não prever concurso público para seleção de agentes municipais que usarão armas, o projeto do prefeito do Rio, Eduardo Paes (PSD), permite que ele e seus sucessores escolham integrantes da tropa de elite da cidade e, assim, desfrutem de uma guarda personalizada.

Caso a proposta de criação da Força de Segurança Armada (FSA) vingue, prefeitos cariocas  terão o direito de definirem critérios para determinar quem vai integrar o grupo. Homens e mulheres, que não terão estabilidade no emprego, serão escolhidos por processo seletivo e terão contratos temporários de um ano, prorrogáveis por até mais cinco anos.

É razoável prever que, para tentar garantir a renovação de seus contratos, essas pessoas terão muito cuidado para não contrariar o prefeito e seus auxiliares. A autonomia deles será nula.

Isso, numa cidade que tem boa parte de seu território dominado por milícias, nascidas da costela do Estado. A influência política nas polícias Civil e Militar é um dos grandes males do Rio de Janeiro — titulares de delegacias e comandantes de batalhões são, historicamente, indicados por deputados. Policiais, pelo menos, têm garantia de emprego. Agora, o prefeito quer institucionalizar o desvio.

Hoje, os cargos de chefia nas polícias estaduais são exercidos por servidores que passaram em concursos, são sujeitos às normas do serviço público. Já a força da FSA será comandada por um diretor-chefe, "de livre nomeação e exoneração pelo Chefe do Poder Executivo". A tropa de elite carioca não pode ter o mesmo destino de departamentos e instalações da prefeitura que viraram moeda de troca no universo político.

A nova versão do projeto prevê que atuais guardas municipais (funcionários públicos estatutários) possam passar por processo seletivo para integrarem a FSA, mas não garante o "direito subjetivo" à manutenção dos escolhidos. A permanência deles vai depender do "atendimento de critérios a serem estipulados em Decreto regulamentador". Quem não se enquadrar perderá a gratificação reservada ao grupo armado, de R$ 10.283,48, mais do dobro dos salários dos atuais guardas.

O projeto não define critérios de seleção para a FSA, diz apenas que poderá ser firmado convênio com órgãos militares ou civis "nos moldes do Centro de Preparação de Ofciais da Reserva — CPOR" (do Exército), com o objetivo de "disciplinar a realização do processo seletivo". Paes já havia defendido a contratação de militares da reserva das forças armadas, o que contraria o direito de cada cidadão de disputar empregos públicos.

A situação é tão absurda que, diferentemente da primeira versão do projeto, a tropa de elite não será autônoma, mas integrada à estrutura da Guarda Municipal, formada por servidores e que seria rebatizada de Força de Segurança Municipal. A futura FSM-RIO teria assim funcionários públicos (ganhando cerca de R$ 4 mil) e temporários (salário de R$ 13.033).

O projeto autoriza o prefeito a "definir atribuições suplementares da FSA, em regulamento próprio, que não confitem com o disposto nesta Lei Complementar". Ou seja, o chefe do executivo poderá usar essas pessoas armadas em defesa de interesses que ele escolherá.

Como disse ao Correio Bastidores o professor de Direito da Uerj Cássio Casagrande, o projeto contraria a Constituição, que só permite ao poder público fazer contratações provisórias em caráter emergencial. Procurador do Ministério Público do Trabalho, ressaltou que a manutenção da segurança pública é uma típica função de Estado.

A sociedade carioca é que será a dona das armas, tem o direito de escolher e controlar quem vai usá-las. E não custa lembrar o exemplo da Guarda Pessoal de Getúlio Vargas, de onde saíram os responsáveis pelo assassinato do major Rubens Vaz, tragédia que culminaria com o suicídio do presidente. Extinto logo depois do crime, o grupo tinha 83 integrantes; o contingente de Paes deverá chegar a 4.500.