Por: Fernando Molica

Ameaças mostram a face de quem se diz vítima do STF

Estátua pichada por Débora Rorigues dos Santos durante a tentativa golpista | Foto: Joedson Alves/Agencia Brasil

Ao ameaçarem duas jornalistas da Folha de S.Paulo, defensores da anistia reforçam a necessidade de punições duras àqueles que atentaram contra a democracia. Mostram que não têm limites, não aceitam o contraditório e continuam a pregar o linchamento dos que consideram inimigos.

Ainda em janeiro de 2023, as repórteres Gabriela Biló e Thaísa Oliveira publicaram reportagem com fotos de mulher que vandalizava a estátua da Justiça durante a intentona de 8 de Janeiro. As fotos permitiram a identificação da pichadora, Débora Rodrigues dos Santos, que está presa há dois anos.

As jornalistas apenas cumpriram o seu papel: Gabriela fotografou o que estava diante dos seus olhos, Thaísa participou de uma apuração posterior sobre o episódio. Não houve qualquer manipulação de imagens ou de informações — mas isso pouco importa para os agressores, pessoas que fogem da verdade da como Eduardo Bolsonaro correu do Brasil.

Chega a ser curioso que a nova de ataques a jornalistas ocorra num momento em que bolsonaristas procurem vitimizar Débora diante da possibilidade de ela ser condenada a 14 anos de prisão, conforme o voto de dois ministros do Supremo Tribunal Federal. Como mostrou a coluna Correio Bastidores, a progressão prevista pela legislação deverá permitir que os condenados pelo 08/01 cumpram em regime fechado entre 16% e 20% da pena; ou seja, mesmo se receber os 14 anos de punição, Débora migraria para o semiaberto ainda em 2025.

Em postagens, esses seus defensores procuram minimizar o gesto de pichar com batom a obra do escultor Alfredo Ceschiatti (1918-1989), tentam isolar o fato de seu contexto, como se a acusada não tivesse participado dos atos violentos que procuravam gerar uma crise institucional e viabilizar um golpe de Estado. A tentativa de virada de mesa, e não a pichação, é a maior reponsável pela pena sugerida pelos ministros.

Ela e seus apoiadores têm o direito de alegar o que quiserem, de apresentar uma versão amenizada do dano à estátua, podem mostrar imagens de Débora com os filhos, insistir que ela é apenas uma brasileira que estava indignada com os rumos do país e resolveu protestar.

A discussão sobre penas aplicadas pelo STF — que variam de um ano a 17 anos e seis meses de reclusão — é válida. Há, mesmo entre não simpatizantes de Jair Bolsonaro, pessoas que consideram exageradas algumas punições, que veem erros na aplicação do Código Penal, que questionam critérios utilizados para a dosimetria de penas. O eventual exagero do STF é um dos principais argumentos para a anistia.

Mas ao partirem para uma ação coordenada de terrorismo virtual, para a exposição de dados pessoais e ameaças de violência física e até de morte, esses defensores de Débora mostram as garras, revelam o que são, reafirmam o que levou tanta gente a se engajar na proposta golpista que culminou com o maior ataque à democracia desde o fim da ditadura que tanto exaltam. Alertam para o risco que seria anistiar golpistas.

As ameaças a Gabriela e Thaísa são uma espécie de versão continuada do quebra-quebra que promovido no 8 de Janeiro, ecoam a tentativa de explosão, no Aeroporto de Brasília, de um caminhão-tanque carregado de combustível. Trazem as digitais da tigrada que, inconformada com a redemocratização, colocou bombas na Ordem dos Advogados do Brasil, no Riocentro e em bancas de jornais. Fazem tabelinha com a exposição de dados pessoais do repórter Thiago Herdy, do UOL, autor de reportagens sobre contratos emergenciais assinados pelo prefeito de São Paulo, Ricardo Nunes (MDB). 

Cabe à polícia identificar e indiciar responsáveis por mais esses ataques à democracia, delinquentes que fazem o favor de reafirmarem quem são e o perigo que representam para a sociedade.