Por: Gabriel Rattes

Gasto milionário com cargos inconstitucionais

Cargos jurídicos comissionados começaram a serem contratados em 2014 | Foto: Reprodução/TV Correio da Manhã

O Correio Petropolitano mostrou recentemente a situação da folha de pagamento do gabinete do prefeito de Petrópolis, Rubens Bomtempo, que durante sua gestão reduziu significativamente o número de cargos concursados e aumentou os vencimentos dos comissionados. A prática, de priorizar cargos indicados, não é exclusividade do gabinete. A Procuradoria Geral do Município, atualmente, tem apenas oito concursados e 39 cargos jurídicos escolhidos pelo prefeito e aliados. A problemática foi levada à Justiça que, em 2022, considerou estes cargos jurídicos inconstitucionais. A prefeitura recorreu, e enquanto o processo está em tramitação, já acumulou na folha de pagamento mais de R$ 4,5 milhões a estes cargos considerados inconstitucionais

Entre outubro de 2022 a junho de 2023, 39 cargos inconstitucionais, entre cargos em comissão e funções gratificadas, estavam ativos e recebendo salário. Em um recorte de junho de 2022 (período em que foram extintos tais cargos por Lei Federal) até abril de 2024, já foram gastos mais de R$ 4,5 milhões pelo Município em cargos considerados inconstitucionais.

O processo que tramita no Tribunal de Justiça do Rio trata-se de uma representação por inconstitucionalidade (RI) ajuizada pela Procuradoria-Geral de Justiça do Estado do Rio de Janeiro contra o Município de Petrópolis. Em um documento datado no dia 22 de junho de 2022, foi afirmado que existiam apenas dez cargos de carreira na Procuradoria Municipal em Petrópolis. "Em contrapartida, os cargos de provimento comissionado na área jurídica, com atribuições de representação judicial ou consultoria jurídica, alcançam o elevado quantitativo de 42, segundo os dispositivos legais impugnados", enfatiza um trecho do processo.

Algumas leis municipais, que criaram estes cargos, e que estão em vigência em Petrópolis são mencionadas no processo como inconstitucionais, entre elas: Lei Municipal nº 7.200/2014; 7.510/2017; e 7.512/2017. De acordo com a Procuradoria do Estado, a Lei Municipal de número 7.200/2014 fere a constitucionalidade por prever diversos cargos comissionados e funções gratificadas que integrariam o quadro de pessoal, incluindo procuradores adjuntos setoriais, assessores jurídicos e chefes de divisões internas.

"Estes cargos, entretanto, possuíam atribuições de consultoria jurídica e representação judicial do Município, próprias de Procuradores Municipais, cujo ingresso na carreira depende, necessariamente, de aprovação em concurso público", explica a Procuradoria do Estado.

Decisão

Segundo o advogado e ex-Procurador de Petrópolis, Marcio Nascimento, atualmente o Governo Municipal conta com apenas oito procuradores de carreira (escolhidos através de um concurso público). Outros 39 são cargos em comissão ou funções gratificadas vinculadas à Procuradoria. "Essa ação pode acabar gerando um passivo muito grande para o município. Já faz quase dois anos que esses cargos se tornaram inconstitucionais por lei. Pode ser que em algum momento dessa RI eles devam ressarcir todo o valor que essas pessoas estão recebendo", disse.

Em junho de 2022, o desembargador do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ), Benedicto Abicair, decidiu parcialmente procedente o pedido para declarar a inconstitucionalidade dos cargos: Procurador Adjunto de Contencioso; Procurador Adjunto Administrativo; Procurador Adjunto do Contencioso Especial da Fazenda Pública; Procurador Adjunto do Contencioso da Dívida Ativa; Assistente Jurídico; Chefe da Divisão Adjunta de Contencioso; Chefe da Divisão de Cobrança Amigável da Dívida Ativa; Chefe da Divisão de Cobranças Judiciais; e Chefe da Divisão de Inscrição da Dívida Ativa.

"[...] as atividades atribuídas aos cargos mencionados coincidem com aquelas exclusivas da função de Procurador Municipal. Assim, a legislação petropolitana não observou a regra constitucional ao permitir que servidores ocupantes de cargos providos em comissão e funções gratificadas exercessem atividades puramente profissionais, que demandam formação técnica específica, típicas e privativas de Procuradores do Município - providos mediante concurso público", disse a Procuradoria-Geral do Estado.

O advogado Márcio Nascimento explica também que ter cargos concursados em um governo, garante mais transparência e segurança para a população. "Nosso objetivo não é acabar com o cabide de emprego dos governantes. Nós queremos que os procuradores concursados exerçam uma hierarquia maior dentro do governo. Mandei ofício, tentei marcar reunião para tentar resolver e nada", enfatizou.

O que diz a Prefeitura

Em resposta ao Correio, a Prefeitura disse que "a decisão somente produzirá efeitos após o trânsito em julgado. Foi o que decidiu a Justiça no fim de 2023 (em 1ª instância) e em abril (em 2ª instância), quando negou um pedido de liminar da Associação Nacional de Procuradores Municipais. Esse entendimento da Justiça teve parecer favorável do Ministério Público, que ainda afirmou no parecer que 'não há qualquer indício de que o dinheiro esteja sendo gasto indevidamente' pela Prefeitura com esses cargos", ainda segundo a Prefeitura, obteve decisão favorável face ao agravo interposto pela associação dos procuradores.