Por: Rodrigo Fonseca | Especial para o Correio da Manhã

Legado animado de Guilherme Fiúza Zenha

Animação 'Chef Jack', de Zenha, que tem Danton Mello como dublador, está na grade da Amazon Prime | Foto: Divulgação

Acessível hoje no streaming nas grades da MAX e da Amazon Prime, a animação "Chef Jack - O Cozinheiro Aventureiro" terá sessão nesta sexta-feira, às 9h, no Centro de Convenções John Wesley, na grade do Festival de Xerém, onde passa como homenagem póstuma a um diretor que fez do cinema infantojuvenil sua bandeira. O mineiro Guilherme Fiúza Zenha morreu no último dia 4, em decorrência de um infarto, aos 58 anos (algumas fontes falam em 56 e outras em 55). Seu legado animado hoje alcança uma nova visibilidade, uma vez que a figura de Jack ajuda a promover seu empenho para que o país investisse em narrativas para crianças e adolescentes.

"Tem uma coisa muito de mineiro nesse filme, pois a cozinha para gente é um lugar afetivo. Não é apenas o ato de comer, é o ato de cozinhar, um ato de amor. A cozinha é o coração da casa em Minas Gerais", disse Zenha ao Correio da Manhã em sua última entrevista ao jornal, quando "Chef Jack" fez uma firme bilheteria de arrancada.

Oráculo na reflexão das manhas de mercado, sempre com respostas críticas acerca dos passos que deveriam ser tomados (com urgência) para o fortalecimento de nosso audiovisual como indústria, o diretor e produtor das Gerais recorria sempre ao conceito de "formação de plateia" para defender novas fornadas de longas-metragens para plateias mirins. Ele fez um dos títulos mais elogiados dessa seara na década passada: "O Menino no Espelho", baseado na prosa de Fernando Sabino.

"Acordei hoje com a triste notícia da morte repentina do querido Guilherme Fiúza Zenha, produtor e cineasta mineiro. Professor apaixonado. Meu tutor eterno. Passei o dia pensando nele e nos nossos encontros", escreveu Joelma Gonzaga, secretária do Audiovisual do MinC, em post no Instagram, quando o colega morreu. Assim como ela, cineastas de todo o país se manifestaram com tristeza pela partida de um realizador que era um agitador cultural. Ele entrou no terreno dos filmes animados com excelências.

Com situações hilárias e muita ação, "Chef Jack - O Cozinheiro Aventureiro" foi baseado numa ideia do roteirista Artur Costa. É uma mistura de "Johnny Quest" com "MasterChef". A trama segue os passos de prodígio da culinária, Jack (na voz de Danton Mello) numa viagem pelo mundo atrás dos ingredientes mais raros para completar suas receitas únicas. Um grave erro na preparação de um prato faz sua reputação virar uma piada. É hora de ele dar a volta por cima numa missão de risco.

Com coragem, Zenha encarou o que há de mais hostil nesse território de um público educado ano a ano pela Disney/Pixar/DreamWorks. Em 2023, ele contou ao Correio sobre a gênese do longa, que agora mantém sua memória viva:

"O 'Chef Jack' nasceu de uma ideia do Artur Costa que contou com uma empresa internacional como a Sony, que resolveu abraçar o filme e distribuí-lo. Não teve que fazer concessões para existir. Não é um projeto que foi desenvolvido com uma plataforma de streaming. Ele é parte das nossas ideias. Eu sou um apaixonado por obras infantojuvenis. Sinto que ali está uma vertente do cinema que tem um pouco da essência humana não contaminada pelos males que nos cercam. De uns anos para cá, um pouco antes de fazer 'O Menino no Espelho', nasceu um pouco dessa preocupação. Eu acho que a gente produz muito pouco para esse público tão importante, que são as crianças. É um dos maiores erros estratégicos nossos, porque, se lá atrás, durante a Retomada, nos anos 1990, tivéssemos pensado um pouco mais nisso, a gente teria criado políticas públicas para o desenvolvimento do audiovisual na formação de plateia. Com isso, a gente cria uma possibilidade real do público poder ver sua história, sua língua, seus personagens, suas cores e a sua diversidade. Fazer cinema no mundo inteiro é difícil. A gente viaja e as queixas na Europa, principalmente, são as mesmas. A questão da disputa das janelas e da disputa do público, pela presença brutal das majors, repete-se lá. À medida que a gente continua produzindo e encontrando janelas, vamos encarando provas de resistência".

Que a memória do cinema brasileiro guarde para sempre um lugar para Zenha.