Por: Mayariane Castro

Planos de saúde negam tratamento a pessoas autistas no DF

Autistas lutam contra preconceito e discriminação. Na foto, manifestação no Dia Mundial da Conscientização | Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil

Investimentos sem retorno. Esta é a realidade que a empreendedora Julia Souza, 42, anos enfrenta ao despender R$ 1 mil reais mensais em plano de saúde sem conseguir, porém, usá-lo quando é necessário. Ser mãe atípica já é uma luta, e lutar sem apoio e sem acesso aos seus direitos é ainda pior. Ela é mãe do Carlos, autista de nível de suporte 3 com 6 anos, e solicitou ao convênio médico os serviços para terapia que foram negados pela empresa. A justificativa é de que o apoio ao autista seria muito caro

Esta é a realidade de ao menos 300 pessoas que denunciaram ao Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT) o cancelamento unilateral de planos de saúde a pessoas autistas. De janeiro a abril deste ano, a Defensoria Pública do Distrito Federal (DPDF) recebeu mais de 300 denúncias de familiares de autistas informando sobre o cancelamento unilateral do plano de saúde, inclusive de tratamento. O número de casos, entretanto, é maior.

Julia não deu entrada no MP com denúncia. Ela faz parte da estatística na qual ainda não conseguiram formalizar a reclamação. “É uma burocracia complicada, meu acesso ao plano foi negado na semana passada, então ainda estou me conformando. É como se o hospital visse meu filho como um gasto, um prejuízo. Foi exatamente essa justificativa que me deram”, lamenta a mãe.

Ela usa o plano Amil e paga R$1.022,28 mensalmente para utilizar o plano de saúde. O serviço é contratado por intermédio da empresa Qualicorp e utiliza da forma de contrato coletivo, sem a necessidade de associação. Mesmo investindo este valor, Julia não teve a consulta com o psiquiatra aceita pelo plano, conforme foi informada por e-mail.

Dentro da sala

A mãe conta que optou por colocar o filho na rede de ensino pública do DF porque, mesmo sendo gerido pelo governo, o filho possui mais suporte e apoio do que em uma escola particular. Por conta de necessidades maiores de suporte, Carlos estuda no Centro De Ensino Especial 01, em Planaltina, com o apoio de uma equipe especializada e específica.

A neuropsicopedagoga Eliane Castro explica que a rede de apoio dentro da escola é mais que fundamental, porém o processo é contínuo. Em 2024, apenas na rede pública de ensino do DF, cerca de 10.605 alunos matriculados são laudados com autismo, em escolas de ensino regular e de ensino especial.

“Não adianta iniciar esse procedimento dentro da escola e não expandir para dentro da rotina da criança. Há a necessidade de terapias ocupacionais para ajudar no desenvolvimento da criança, que nesta idade é primordial para que ela não tenha atraso. É preciso contato com fonoaudiólogo, com psiquiatras e psicólogos, e outros campos da medicina que ajudem e ofereçam apoio ao autista”.

Eliane acrescenta que esta postura dos planos de saúde é criminosa e se enquadra na Lei nº 13.146 de 2015, que criminaliza e penaliza o crime de capacitismo. “São grandes empresas corporativas que visam apenas o lucro. Enxergam pessoas como fonte de dinheiro e isso é desumano em qualquer contexto, porém é ainda mais grave quando se trata de pessoas autistas”.

Soluções

Após as denúncias públicas, como medida preliminar, a Promotoria de Justiça de Defesa do Consumidor (Prodecon) enviou ofícios aos planos de saúde da Amil e da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) para obter esclarecimentos sobre o assunto. A empresa Amil alegou prejuízo financeiro quando cancelou os convênios e não ofereceu nenhum tipo de solução alternativa, apenas deixando os usuários sem amparo.

A Comissão de Direitos das Pessoas com Deficiência da Assembleia Legislativa de São Paulo (Alesp) aprovou, nesta terça (14), um convite para que o dono da Amil, José Seripieri Filho, prestasse esclarecimentos diante das reclamações. O posicionamento, entretanto, não possui data marcada e a rede Amil precisa responder ao pedido do MPDFT.

Diante da situação, foi enviado um projeto de Lei para a Câmara Legislativa do DF (CLDF) nesta quarta-feira (15), que propõe mudanças nos casos de suspensão e rescisão de contratos de planos de saúde. O texto é de autoria do deputado distrital Gabriel Magno (PT), que é o presidente da Comissão da Educação, Saúde e Cultura. A proposta prevê alteração na Lei nº 6.316, de 4 de julho de 2019.