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A empatia seletiva

No dia 8 de março é comemorado o Dia Internacional da Mulher. A data é celebrada uma semana após o filme brasileiro "Ainda Estou Aqui", dirigido por Walter Salles, ganhar o primeiro Oscar da história do cinema brasileiro como Melhor Filme Estrangeiro. E o fato do longa-metragem vencer a maior premiação audiovisual mundial por narrar a história de Eunice Paiva torna tudo ainda mais simbólico para uma data que celebra mulheres.

Eunice Paiva tinha uma vida tranquila com sua família quando, em 20 de janeiro de 1971, teve sua casa invadida por militares, que levaram seu marido (o ex-deputado federal Rubens Paiva), que nunca mais voltou. Além de ter sido interrogada durante o regime militar, Eunice teve que mudar completamente sua vida para proteger seus cinco filhos, tornando-se uma advogada atuando em prol de direitos humanos. Tudo isso lidando com o luto de perder seu marido e somente conseguir um atestado de óbito em 1996, 25 anos após o desaparecimento de seu marido.

O respeito e a admiração que a atriz Fernanda Torres teve ao interpretar Eunice Paiva fizeram a performance da atriz ser tão fora da curva e dignas de um Oscar de Melhor Atriz. Contudo, a brasileira perdeu o prêmio para a atriz Mikey Madison, que interpretou a protagonista de "Anora" - que ganhou também o prêmio de melhor filme do ano. No filme "Anora", a atriz norte-americana interpreta uma prostituta, que tem a chance de mudar de vida ao se casar repentinamente com um filho de um oligarca russo rico e mimado. Ao longo da história, o que deveria ser um conto de fadas se torna um longo pesadelo para a protagonista.

É certo que o telespectador ficou desapontado por Fernanda Torres não ter levado a premiação da noite. Mas a atriz norte-americana recebeu uma chuva de críticas, ameaças e insultos por ter ganhado o prêmio. A atriz, que apenas estava fazendo seu trabalho ao interpretar o papel de uma profissional do sexo, passou a ser chamada de atriz pornô, acusada de ter vencido por ter mostrado o corpo nas filmagens. O que deveria ser uma celebração de performances tão memoráveis, de mulheres fortes (cada uma à sua maneira) se tornou um caso de empatia seletiva. Para celebrar ou engradecer uma mulher, não se deve diminuir outra.

De um lado, há um filme sobre uma mulher que teve que lutar com todos os recursos que tinha para proteger sua família, de outro temos uma mulher que precisa se proteger como pode em uma área tão marginalizada. Independente de quem não concorda com os resultados e os classificou como injustos, ataques contra a atriz são inaceitáveis. A empatia por uma pessoa não deve ser a ruína de outra. É violência mascada de "opinião".