Por: Thamiris de Azevedo

De Ceilândia para o planeta Terra

O Brasil se desmancha em lama, na visão da estudante Lilian | Foto: Divulgação/CGE

No desenho, a bandeira brasileira se desmancha, e vai virando uma lama gosmenta e marrom, como a que escorreu pelo rio quando estourou a barragem de Brumadinho. No título, os versos da canção de Cazuza, que volta ao foco agora com a exibição da nova versão da novela Vale Tudo.

A arte feita pela estudante Lilian Kauna, em exibição no foyer de entrada do plenário da Câmara Legislativa do DF (CLDF), não chamou a atenção somente dos visitantes que por ali passam. Ele já correu o mundo.

Estudantes do Centro de Ensino Ceilândia 02 (CEM02) produziram pinturas que fazem parte do programa Descarbonize Brasília, parte do projeto internacional #Descarbonize Global Child Climate, promovido pelo Centre for Global Education (CGE) em parceria com a Universidade de Alberta de Canadá, Unesco, e outras entidades internacionais, inseridos na galeria virtual Art4clima.

A Art4Action é um acervo de arte virtual internacional hospedada pelo CGE. O objetivo é encorajar a criatividade de jovens para exibir seus pensamentos, ideias e emoções sobre questões globais relacionadas aos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) da ONU.

Apelo

Em nota, o CGE define o programa #Descarbonize Global Child Climate como um apelo para as partes interessadas pelo clima em todo o mundo, onde, por meio da tecnologia, reúne vozes e experiências vividas pelas crianças entre 5 e 18 anos, centralizando-as no aprendizado climático digital para aumentar a empatia, a tomada de perspectiva, o pertencimento e a ação.

O programa envolve mais de 10 mil estudantes de centenas de escolas de 75 países em seis continentes diferentes. O CEM 02 Ceilândia é a única unidade da rede pública de ensino do Brasil que participou do projeto.

O conjunto de pinturas, incluindo os desenhos de alunos brasileiros, foram apresentados na 29ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP29), realizada em Baku, no Azerbaijão.

Obras

Além das obras na exposição virtual, os quadros físicos estão no foyer do plenário da Câmara Legislativa do Distrito Federal (CLDF) até a próxima sexta-feira (28), em exposição intitulada “Dercarbonize Brasília: Nutrindo agentes de mudança, contadores de histórias, tomadores de ação e cidadãos globais”.

Macaque in the trees
As obras expostas no Foyer da CLDF | Foto: Matheus Lincoln/Correio da Manhã

A produção foi coordenada pela professora de Artes do Centro Educacional 02 de Ceilândia, Delviene Melo, durante as aulas para o 3º ensino médio. Professores de diversas disciplinas, em uma metodologia transversal, lecionaram sobre os riscos das mudanças climáticas. Também foram promovidos encontros com universitários e docentes da Universidade de Alberta, do Canadá, para tratar dos temas. A partir dessas dinâmicas, os alunos colocaram para fora, em forma de arte, aquilo que absorveram do conteúdo.

O diretor do Centro Educacional, Eliel Aquino, destaca a importância da conscientização entre os jovens.
“Para além do fazer pedagógico, o projeto consegue envolver os alunos e a riqueza desse envolvimento com o tema, levado a conscientização dos problemas que tem relação com as questões climáticas”.

O aluno Matheus Campos, 18 anos, compartilha com a reportagem a sua experiência na execução do projeto. Para ele, a participação o fez enxergar que a arte é uma ferramenta de expressão e transformação.
“Aprendi que por meio do desenho podemos abordar temas importantes e conectar pessoas ao redor do mundo. Foi enriquecedor ver minha arte alcançar lugares como a Universidade do Canadá. Percebi que minha voz pode ecoar além das fronteiras. Aprendi muito sobre as questões climáticas e a importância da conscientização. Acredito que pequenas ações quando somadas geram grandes impactos”.

Escola sustentável

Em entrevista ao Correio da Manhã, o coordenador de projetos sustentáveis do CEM02 e embaixador do Descarbonize Brasília, Davi Fagundes, destaca que os projetos elaborados na instituição de ensino objetivam alertar o poder público, em esfera federal e regional, sobre os problemas climáticos.

“Queremos deixar para os estudantes um rol de empoderamento dessas informações para cobrar das autoridades públicas e sensibilizá-los para ações que não acontecem nem no DF e nem no Brasil”.
Ele ressalta a importância da inclusão da justiça climática na agenda educacional, e a iniciativa de tentar provocar os deputados distritais com a exposição na CLDF, para reconhecerem, através de olhar dos alunos, a preocupação da comunidade escolar.

“A exposição na Câmara Legislativa do DF foi proposital para sensibilizar os deputados a dar atenção às questões climáticas nas escolas do DF. Não vemos por parte do GDF nenhuma preocupação. Não conhecem a gente, e queremos que eles nos conheçam. Queremos transformar a nossa escola em uma escola sustentável. A primeira do DF. Queremos que esse direito chegue até as escolas”.

A professora de informática Valéria Assis, integrante do programa, lembra a presença do negacionismo climático, mesmo com os evidentes problemas ambientais.

“O projeto e importante para bater de frente com o negacionismo, presente mesmo com os evidentes problemas climáticos, como as ondas extremas de calor”.

A escola foi novamente convidada para participar da COP30, que vai acontecer em novembro deste ano em Belém do Pará. Desta vez, o convite foi motivado pela parceria da escola com a Universidade de Brasília que está instituindo um Centro de Estudos Amazônicos na unidade escolar.

O que é descarbonizar

“Melhor você perguntar o que não é descarbonizar!” ironizou o professor Davi.

“Atualmente, por exemplo, o DF tem mais de 2 milhões de veículos circulando e produzindo gigas de CO2. Não descarbonizar é a ausência em transformar a sociedade e o meio ambiente, promovendo a transição energética que é tão necessária atualmente. Não há ações pontuais nas escolas. Já descarbonizar, é colocar em execução os planos de emergência, adaptação e mitigação climática a favor da população, principalmente aos grupos vulneráveis mais afetados que não têm o mínimo de dignidade climática. É o empoderamento da sociedade das informações para mudar a realidade climática, ambiental e social que estamos mergulhados na atualidade”, continuou.