Por: Rodrigo Fonseca | Especial para o Correio da Manhã

Saída à francesa

'Tempo Suspenso', novo Assayas, amplia a frente francesa no Brasil | Foto: Carole Bethuel/Divulgação

Tem François Ozon novo vindo aí... e um Ozon premiado: "Quando Chega o Outono" ("Quand Vient L'Automne"), laureado com o troféu de Melhor Roteiro no Festival de San Sebastián, em 2024. É um filme sobre cogumelos, garotas de programa anciãs aposentadas, mágoas de filha por mãe e uma Borgonha ensolarada. Entra em cartaz até abril. Quando tem Ozon é porque a dinâmica de produção e de distribuição do cinema francês está operando na sua plenitude. É o indício de que a conexão da pátria presidida por Emmanuel Macron com o Brasil, no âmbito do audiovisual, permanece correndo bem. A equação comercial da cinefilia em nosso país não fecha sem a França. Ainda que esta semana vá ser abalada com a chegada de uma nova versão da "Branca de Neve", com CEP em Hollywood, a filmografia mais prolífica da Europa sempre faz uma diferença na balança comercial do circuito exibidor - sobretudo aquele menos refém dos blockbusters. A estreia de maior destaque vinda das bandas que nos deram a Nouvelle Vague é "Tempo Suspenso" ("Hors du Temps"), de Olivier Assayas, que nos chega nesta quinta.

Indicada ao Urso de Ouro da Berlinale em 2024, a produção mais recente do realizador de "Wasp Network: Rede de Espiões" (2019) é uma comédia regada de tintas filosóficas que revista os rituais do confinamento, a partir de vivências do próprio Assayas. Na trama, dois irmãos, o cineasta Paul (Vincent Macaigne, hilário) e o jornalista e crítico de música Etienne (Micha Lescot) estão confinados na casa de campo da família, no interior da França, junto com suas parceiras Morgane (Nine d'Urso) e Carole (Nora Hamzawi). Cada cômodo, cada objeto, as árvores do jardim lhes trazem as memórias da infância e seus fantasmas. Uma comédia autobiográfica.

"As diferentes manifestações da tecnologia que criamos como um facilitador da vida podem ser úteis, desde que sejamos capazes de manter a consciência atenta e arguta", disse Assayas ao CORREIO DA MANHÃ, antes das filmagens, em referência ao clima de desintoxicação eletrônica vivido pelos personagens de "Tempo Suspenso", numa divertida reconstituição da fase de isolamento vivida pelo planeta em decorrência do coronavírus.

Alter ego do diretor, o personagem de Macaigne até faz terapia via Zoom, por celular, e conversa com sua filha por Facetime. A bolha silvestre e burguesa que o cerca traz um lirismo que lembra o cinema de François Truffaut e o de Éric Rohmer, um dos pilares da formação de olhar de Assayas, que escreveu críticas antes de dirigir.

"O verbo 'refletir' ficou descartável numa sociedade que quer gratificações imediatas", explicou Assayas em sua última passagem pelo Rio de Janeiro, há seis anos.

Estima-se que nesta quinta estreia ainda outra produção egressa de Paris: "O Bom Professor" ("Pas Des Vagues"), de Teddy Lussi-Modest. François Civil brilha em cena, no papel de um educador enredado numa teia de suposições acerca de seu caráter. O longa foi uma das mais concorridas atrações do último Festival Varilux, maratona francófona das Américas, que abriu telas do país para a realizadora Anne Fontaine e seu "Bolero: A Melodia Eterna" ("Bólero"), um drama de tintas biográficas.

Com estreia por aqui prevista para o dia 3 de abril, o longa de Fontaine viaja até 1928, nos vibrantes "anos loucos" de Paris, quando a dançarina Ida Rubinstein (Jeanne Balibar) encomenda a Maurice Ravel (Raphaël Personnaz) a música para seu próximo balé. Enfrentando uma crise de inspiração, o compositor revisita os capítulos de sua vida - os desafios de seus primeiros exercícios musicais, as marcas da I Guerra e o amor impossível por sua musa.

Representante da França no Oscar, "Emilia Pérez", ganhador das estatuetas de Melhor Canção ("El Mal") e Melhor Atriz Coadjuvante (Zoe Saldaña) segue em cartaz no Rio. De lá chegaram ainda "Meu Verão Com Glória" ("Àma Gloria"), de Marie Amachoukeli-Barsacq, e "Loucos Por Cinema!" ("Spectateurs!"), de Arnaud Desplechin.