Vinte e um de janeiro de 2024. Lázaro Ramos, em viagem a Salvador para visitar a família, desmaia e é hospitalizado. O diagnóstico: burnout. "Fui criado para ficar num sistema de defesa. Aquela coisa de quem vem de família pobre e tem medo do fracasso o tempo todo. Acho que mesmo depois que eu fiquei conhecido, ainda era assim", afirma ele que, alçado à fama como ator, desde então assumiu muitas outras funções no campo da arte.
Lázaro diz acreditar que a crise foi um aviso de seu próprio corpo de que era necessário mudar suas prioridades. "Foi ele dizendo olha, vou te parar aqui, na sua cidade-mãe, para você se olhar."
Mas olhar para si mesmo acabou significando olhar também para a mãe dele, dona Célia, morta pouco depois de o artista chegar à maioridade e citada muito pontualmente em seu primeiro livro biográfico, "Na Minha Pele".
A ausência tinha sido proposital. Lázaro diz que, quando escreveu a obra, achou que a história de sofrimento da mãe - uma empregada doméstica que se calou diante de abusos dos patrões e passou os últimos meses de vida presa a uma cama, sem conseguir mover a maior parte do corpo em decorrência de uma doença rara - desmotivaria os leitores.
Mas sua perspectiva mudou desde a publicação do livro, oito anos atrás. E quando a escrita se anunciou como um refúgio após o burnout, ele se viu voltando a dona Célia. Daí o título do novo livro: o pronome de "Na Nossa Pele" a princípio se referia a ele e à sua mãe. Não demorou até que o artista percebesse que estava falando de muito mais gente. Uma lição que os leitores de "Na Minha Pele" já tinham ensinado a ele.
"Achei que estava escrevendo uma história dos aprendizados que tive", diz Lázaro sobre o livro anterior. "Mas a coisa que eu mais via as pessoas escrevendo era 'nossa, parece que essa é a minha história, que eu que escrevi esse livro'."
"Na Minha Pele" pode ser considerado um ponto de inflexão na ampliação do debate sobre o racismo no país. O livro, publicado em 2017, vendeu milhares de exemplares e motivou dezenas de teses acadêmicas - Lázaro exibe na tela do Zoom uma delas, encadernada em couro, que segundo ele tinha chegado na semana anterior.
"Na Nossa Pele", por sua vez, atualiza muitas das discussões propostas no volume anterior, apresentando inclusive uma espécie de balanço sobre o avanço da representatividade negra nas universidades, nas empresas, na cultura de massa, desde então. As muitas referências que o lançamento faz a seu antecessor tornam aconselhável ler este antes, aliás.
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